OS MAIAS
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leu os titulos dos livros, respirou o perfume dos frascos, abriu os cortinados de sêda do leito... Sobre uma commoda Luiz XV havia uma salva de prata, transbordando de retratos que Carlos se esquecera de esconder, a coronella d’hussards d’amazona, madame Rughel decotada, outras ainda. Ella mergulhou as mãos, com um sorriso triste, na profusão d’aquellas recordações... Carlos, rindo, pediu-lhe que não olhasse «esses enganos do seu coração».

Porque não? dizia Maria, séria. Sabia bem que elle não descera das nuvens, puro como um seraphim. Havia sempre photographias no passado d’um homem. De resto tinha a certeza que nunca amára as outras como a sabia amar a ella.

— Até é uma profanação fallar em amor quando se trata d’essas coisas d’acaso, murmurou Carlos. São quartos de estalagem onde se dorme uma vez...

No emtanto Maria considerava longamente a photographia da coronella d’hussards. Parecia-lhe bem linda! Quem era? Uma franceza?

— Não, de Vienna. Mulher d’um correspondente meu, homem de negocios... Gente tranquilla, que vivia no campo...

— Ah, viennense... Dizem que tem um grande encanto as mulheres de Vienna!

Carlos tirou-lhe a photographia da mão. Para que haviam de fallar d’outras mulheres? Existia em todo o vasto mundo uma mulher unica, e elle tinha-a alli abraçada sobre o seu coração.