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OS MAIAS

— Oh minha senhora!... murmurava elle, um lapis basta...

Quando se sentou, os seus olhos demoraram-se com uma curiosidade enternecida n’esses objectos familiares onde pousava a doçura das mãos d’ella — um sinete d’agatha sobre um velho livro de contas, uma faca de marfim com monogramma de prata ao lado d’uma taçasinha de Saxe cheia d’estampilhas; e em tudo havia a ordem clara que tão bem condizia com o seu puro perfil. Na rua o realejo calára-se, por cima do tecto já não cavallavam as crianças. E, em quanto escrevia devagar, Carlos sentia-a abafar sobre a esteira o som dos seus passos, mover os seus vasos mais de leve.

— Que bonitas flôres v. exc.ª tem, minha senhora! disse elle, voltando a cabeça, em quanto ia seccando distrahida e lentamente a receita.

De pé, junto do contador arabe, onde pousava um vaso amarello da India, ella arranjava folhas em volta de duas rosas.

— Dão frescura, disse ella. Mas imaginei que em Lisboa havia mais bonitas flôres. Não ha nada que se compare ás flôres de França... Pois não é verdade?

Elle não respondeu logo, esquecido a olhar para ella, pensando na doçura de ficar alli eternamente n’aquella sala de reps vermelho, cheia de claridade e cheia de silencio, a vêl-a pôr folhas verdes em torno de pés de rosa!