OS MAIAS
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E no seu desejo de vêr todos em torno de si felizes como elle e como a terra sequiosa que ia ser consolada — Carlos metteu uma libra na mão do tio André, que ficou deslumbrado, sem ousar fechar os dedos sobre aquelle ouro extraordinario que reluzia.

Quando Maria entrou no kiosque trazia um cofre de sandalo. Atirou-o para o divan: fez sentar Carlos ao lado, bem confortavel, entre almofadas: accendeu-lhe uma cigarrete. Depois agachou-se aos seus pés, sobre o tapete, como na humildade de uma confissão.

— Estás bem assim? Queres que o Domingos te traga agua e cognac?... Não? Então ouve agora, quero-te contar tudo...

Era toda a sua existencia que ella desejava contar. Pensára mesmo em lh’a escrever n’uma carta interminavel, como nos romances. Mas decidira antes tagarellar alli uma manhã inteira, aninhada aos seus pés.

— Estás bem, não estás?

Carlos esperava, commovido. Sabia que aquelles labios amados iam fazer revelações pungentes para o seu coração — e amargas para o seu orgulho. Mas a confidencia da sua vida completava a posse da sua pessoa: quando a conhecesse toda no seu passado sentil-a-hia mais sua inteiramente. E no fundo tinha uma curiosidade insaciavel d’essas coisas que o deviam pungir e que o deviam humilhar.