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OS MAIAS

Agora o seu dia estava findo: — mas, passadas as longas horas, terminada a longa noite, elle penetraria outra vez n’aquella sala de reps vermelho, onde ella o esperava, com o mesmo vestido de sarja, enrolando ainda folhas verdes em torno de pés de rosa...

Pelo Aterro, por entre a poeira de verão e o ruido das carroças, o que elle via era essa sala, esteirada de novo, fresca, silenciosa e clara: por vezes uma phrase que ella dissera cantava-lhe na memoria, com o tom d’ouro da sua voz; ou luziam-lhe diante dos olhos as pedras dos seus anneis entremettidos pelos pêllos de Niniche. Parecia-lhe mais linda, agora que conhecia o seu sorriso d’uma graça tão delicada; era cheia de inteligencia, era cheia de gosto; e a pobre velha á porta, esse doente a quem ella mandava vinho do Porto, revelavam a sua bondade... E o que o encantava é que não tornaria mais a farejar a cidade como um rafeiro perdido, á busca dos seus olhos negros; agora bastava-lhe subir alguns degraus, abria-se diante d’elle a porta da sua casa; e tudo de repente na vida parecia tornar-se facil, equilibrado, sem duvidas e sem impaciencias.

No seu quarto, no Ramalhete, Baptista entregou-lhe uma carta.

— Trouxe-a a escosseza, já v. exc.ª tinha sahido.

Era da Gouvarinho! Meia folha de papel, tendo simplesmente escripto a lapis — all rigth. Carlos