OS MAIAS
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amarrotou-a, furioso. A Gouvarinho!... Não se tornára quasi a lembrar d’ella, desde a vespera, no radiante tumulto em que andára o seu coração. E era no comboio d’essa noite, d’ahi a horas, que deviam ambos partir para Santarem, a amarem-se, escondidos n’uma estalagem! Elle promettera-lh’o, a sério; já ella se preparára decerto, com a atroz cabelleira postiça, com o water-proof de grande roda; tudo estava all rigth... Achou-a n’esse instante ridicula, reles, estupida... Oh, era claro como a luz que não ia, que nunca iria, jámais! Mas tinha d’apparecer na estação de Santa Apolonia, balbuciar uma desculpa tosca, assistir á sua desconsolação, vêr-lhe os olhos marejados de lagrimas. Que massada!... Teve-lhe odio.

Quando chegou á mesa do almoço Craft e Affonso, já sentados, fallavam justamente do Gouvarinho, e dos artigos que elle continuava gravemente a publicar no Jornal do Commercio.

— Que besta essa! exclamou Carlos n’uma voz que sibilava, desabafando sobre a litteratura politica do marido a colera que lhe davam as importunidades amorosas da mulher.

Affonso e Craft olharam-n’o, pasmados de tanta violencia. E Craft censurou-lhe a ingratidão. Porque, realmente, não havia em toda a terra um enthusiasmo como o que aquelle desventuroso homem d’estado tinha por Carlos...

— V. exc.ª não faz idéa, snr. Affonso da Maia. É um culto. É uma idolatria!