420
OS MAIAS

a jantar diante de Carlos, a vêr-lhe a alegria e a paz — sentindo aquella negra desgraça que descia sobre elle á maneira que a noite descia. Foi pedir as sopas ao marquez, que desde o sarau se conservava em casa, de garganta entrapada. Depois, ás oito e meia, quando calculou que Villaça devia estar já no Ramalhete, deixou o marquez que se enfronhára com o capellão n’uma partida de damas.

Aquelle lindo dia, toldado de tarde, findára n’uma chuvinha miuda que transia as ruas. Ega tomou uma tipoia. E parava no Ramalhete, já terrivelmente nervoso, quando avistou Villaça no portal, de guardachuva sob o braço, arregaçando as calças para sahir.

— Então? gritou-lhe o Ega.

Villaça abriu o guardachuva, para murmurar debaixo, mas em segredo:

— Não foi possivel... Disse que tinha muita pressa, que não me podia ouvir.

Ega bateu o pé, desesperado:

— Oh homem!

— Que quer o amigo? Havia de o agarrar á força? Ficou para ámanhã... Tenho de cá estar ámanhã ás onze horas.

Ega galgou as escadas, rosnando entre dentes: «Irra! não sahimos d’esta!» Foi até ao escriptorio de Affonso. Mas não entrou. Através d’uma fenda larga do reposteiro meio franzido, um canto da sala apparecia, quente e cheio de conchêgo, no dôce