OS MAIAS
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vidraças. Carlos ergueu-se arrebatadamente, n’uma revolta de todo o sêr:

— E tu acreditas que isso seja possivel? Acreditas que succeda a um homem como eu, como tu, n’uma rua de Lisboa? Encontro uma mulher, ólho para ella, conheço-a, durmo com ella e, entre todas as mulheres do mundo, essa justamente ha de ser minha irmã! É impossivel... Não ha Guimarães, não ha papeis, não ha documentos que me convençam!

E como Ega permanecia mudo, a um canto do sofá, com os olhos no chão:

— Dize alguma coisa, gritou-lhe Carlos. Duvída tambem, homem, duvída commigo!... É extraordinario! Todos vocês acreditam, como se isto fosse a coisa mais natural do mundo, e não houvesse por essa cidade fóra senão irmãos a dormir juntos!

Ega murmurou:

— Já ia succedendo um caso assim, lá ao pé da quinta, em Celorico...

E n’esse momento, sem que um rumor os prevenisse, Affonso da Maia appareceu n’uma abertura do reposteiro, encostado á bengala, sorrindo todo com alguma idéa que decerto o divertia. Era ainda o chapéo do Villaça.

— Que diabo fizeram vocês ao chapéo do Villaça? O pobre homem andou por ahi afflicto... Teve de levar um chapéo meu. Cahia-lhe pela cabeça abaixo, enchumaçaram-lh’o com lenços...