476
OS MAIAS

duas carruagens da casa, vazias, com as lanternas recobertas de longos véos de crepe que pendiam. Atraz, um a um, desfilaram os trens da Companhia com os convidados, que abotoavam os casacos, corriam os vidros contra a friagem do dia ennevoado. O Darque e o Vargas iam no mesmo coupé. O correio do Gouvarinho passou choutando na sua pileca branca. E, sobre a rua deserta, cerrou-se finalmente para um grande luto o portão do Ramalhete.

Quando Ega voltou do cemiterio encontrou Carlos no quarto, rasgando papeis, emquanto o Baptista, atarefado, de joelhos no tapete, fechava uma mala de couro. E como Ega, pallido e arrepiado de frio, esfregava as mãos, Carlos fechou a gaveta cheia de cartas, lembrou que fossem para o fumoir onde havia lume.

Apenas lá entraram, Carlos correu o reposteiro, olhou para o Ega:

— Tens duvida em lhe ir fallar, a ella?

— Não. Para que?... Para lhe dizer o que?

— Tudo.

Ega rolou uma poltrona para junto da chaminé, despertou as brazas. E Carlos, ao lado, proseguiu devagar, olhando o lume:

— Além d’isso, desejo que ella parta, que parta já para Paris... Seria absurdo ficar em Lisboa... Emquanto se não liquidar o que lhe pertence, ha-de-se-lhe estabelecer uma mezada, uma larga mezada... Villaça vem d’aqui a bocado para fallar d’esses