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OS MAIAS

trinta annos, do que este simples facto: tão profundamente tem baixado o caracter e o talento, que de repente o nosso velho Thomaz, o homem da Flôr de Martyrio, o Alencar d’Alemquer, apparece com as proporções d’um Genio e d’um Justo!

Ainda fallavam de Portugal e dos seus males quando a tipoia parou. Com que commoção Carlos avistou a fachada severa do Ramalhete, as janellinhas abrigadas á beira do telhado, o grande ramo de girasoes fazendo painel no logar do escudo d’armas! Ao ruido da carruagem, Villaça appareceu á porta, calçando luvas amarellas. Estava mais gordo o Villaça — e tudo na sua pessoa, desde o chapéo novo até ao castão de prata da bengala, revelava a sua importancia como administrador, quasi directo senhor durante o longo desterro de Carlos, d’aquella vasta casa dos Maias. Apresentou logo o jardineiro, um velho, que alli vivia com a mulher e o filho, guardando o casarão deserto. Depois felicitou-se de vêr emfim os dois amigos juntos. E ajuntou, batendo com carinho familiar no hombro de Carlos:

— Pois eu, depois de nos separarmos em Santa Apolonia, fui tomar um banho ao Central e não me deitei. Olhe que é uma grande commodidade o tal sleeping-car! Ah lá isso, em progresso, o nosso Portugal já não está atraz de ninguem!... E v. exc.ª agora precisa de mim?

— Não, obrigado, Villaça. Vamos dar uma volta