528
OS MAIAS

Para arrastar os passos tristes desde o Gremio até á Casa Havaneza? Não! Paris era o unico logar da terra congenere com o typo definitivo em que elle se fixára: — «o homem rico que vive bem». Passeio a cavallo no Bois; almóço no Bignon; uma volta pelo boulevard; uma hora no club com os jornaes; um bocado de florete na sala d’armas; á noite a Comédie Française ou uma soirée; Trouville no verão, alguns tiros ás lebres no inverno; e através do anno as mulheres, as corridas, certo interesse pela sciencia, o bric-à-brac, e uma pouca de blague. Nada mais inoffensivo, mais nullo, e mais agradavel.

— E aqui tens tu uma existencia d’homem! Em dez annos não me tem succedido nada, a não ser quando se me quebrou o phaeton na estrada de Saint-Cloud... Vim no Figaro.

Ega ergueu-se, atirou um gesto desolado:

— Falhámos a vida, menino!

— Creio que sim... Mas todo o mundo mais ou menos a falha. Isto é, falha-se sempre na realidade aquella vida que se planeou com a imaginação. Diz-se: «vou ser assim, porque a belleza está em ser assim». E nunca se é assim, é-se invariavelmente assado, como dizia o pobre marquez. Ás vezes melhor, mas sempre differente.

Ega concordou, com um suspiro mudo, começando a calçar as luvas.

O quarto escurecia no crepusculo frio e melancolico d’inverno. Carlos pôz tambem o chapéo: e