INDIOS PARECIS
A’ semelhança da ossada fossil do Centimano do mytho grego, a cordilheira dos Parecis alonga suas ramificações por diversos pontos da provincia de Mato Grosso, abrigando em seu interior as Sete Lagôas, que se desenrolam alvacentas como as dobras do lençol de morte, cahidas do esquife excelso do Titan.
Os seus campos de duzentas leguas determinam limites entre Mato Grosso e Goyaz.

Ahi, na cumiada dos Sete-Morros e nas planicies sem fim, dominava a nação dos Parecis, quando os irmãos Barros, de Sorocaba, as exploraram em 1733.
A tribu dos Parecis, numerosa e forte outr’ora, é hoje dizimada e enfraquecida pelas circumstancias antagonistas, que lhe entravam o desenvolvimento, a conservação e o progresso.
Estes indios vivem da caça e da pesca.
Habeis no entesar do arco, a morte empresta-lhes a aza que vôa na flecha que arremeçam ; e o cipó bravo, trazido por elles das matas e que envenena o peixe,offerece-lhes o tributo dos rios e dos lagos á alimentação da vida.
Doceis, dotados de sentimentos paternaes, não vendem ou trocam como os demais selvicolas os filhos, o que é admiravel e bello.
Quaes fantasmas de derrocados imperios revendo ao luar o esplendor das tradições extinctas, elles buscam a quietação e não a luta, a paz e não a guerra.
E não encerrará essa palavra tão simples todas as angustias de sua grande alma ?
Silencio!...
Diante do tumulo a fechar-se de seus derradeiros filhos a America selvagem pede paz.
— E’ uma supplica n’um epitaphio !
I
Cerca de cincoenta kilometros abaixo das Torres, nota vel curiosidade natural á margem esquerda do Guaporé, eleva-se a riba opposta n’um vasto descampado de uns quatro a cinco metros de altura sobre as enchentes ordinarias.
Tem esse descampado o nome de Campos do Páo-Cerne ; e por Indios de Páo-Cerne é conhecida a nação que habita as margens daquelle formoso rio, n’uma zona de quasi duzentos e cincoenta kilometros, desde além das Torres até a barra do Paragahú e o morro de Garajuz, quasi 13° 5’ sul.
As Torres são um agglomerado de blocos mais ou menos rectangulares, dispostos de modo tal que apparecem ao navegante como as ruinas de um obelisco ou uma verdadeira torre quadrangular.
Cercam-a monticulos de outros seixos iguaes : uns della cahidos, visto que sua apparencia actual muito differe do descripto pelos antigos exploradores ; e outros que, talvez, formassem uma segunda torre, conforme nol-o dá á suppôr a denominação plural com que foi sempre conhecida essa localidade.
Acredito serem os Garayos os mesmos Garajuz dos antigos, e cujo nome perdura ainda nos morros auriferos e no porto das minas descobertas em meio do seculo XVIII, e onde mais tarde Luiz de Albuquerque estabeleceria a hoje extincta povoação de Viseu.
Formam diversos aldeamentos, alguns retirados do Guaporé,e outros á suas margens. Calculo a povoação destes em mais de quatrocentas almas, e no dobro o totum da tribu.
Descendo o Guaporé em 1877 tive occasião de vêr as aldeas ribeirinhas. São cinco : Flechas, Guarapiranga, Jangada, Veados e Acorizal,
todas derivando seus nomes dos da localidade,