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Não digo isto por ouvir dizer, porem observei nos que se criam em casa presos. Este phenomeno não se dá sem uma razão profunda, e fundada na naturesa, e me parece ser esta: a côr da pelle e das pennas é devida á disposição e qualidade do alimento, que nutre a ave, porque diz o philosopho, a pelle e as pennas nascem, crescem e se nutrem com a superfluidade dos alimentos: ora a côr branca faz suppor alimentação leve e delicada, e por isso a avesinha ao sahir da casca do ovo, vivendo somente á custa de moscas e mosquitos, que vôam ao redor d’elle, é natural que suas plumas, originadas de tão fraca comida, tenham a côr branca.

A côr negra porem faz crer em abundancia e superfluidade de alimentação, porque a intensidade do calor natural vae sempre excitando o apetite, e empurrando-o para o pasto e por isso notei, que quando esta ave tem as pennas pretas é glutão e come constantemente.

A côr parda e meia vermelha mostra uma tendencia, ou uma regra, nascida expontaneamente da naturesa para acolher uma certa alimentação, que lhe é propria, e então observei escolher esta ave uma comida singular e especial, isto é — os carangueijos, os quaes consummidos no estomago, ahi se transformam em chylo vermelho como escarlate, e este cahindo no figado, se d’elle não receber alguma côr, como acontece com os outros animaes, tinge-o com sua côr, e sempre assim passa para as veias, das veias para a carne, da carne para as pennas, e tão perfeitamente, que si fosse um mettido dentro de uma panella para cozinhar, podia dizer-se que havia dentro uma porção de vermelhão.

Entre milhares de lagartos e reptis do mar, appliquei minha attenção para uma especie bem monstruosa.

É um animal que vive umas vezes n’agoa, outras em terra, e tambem nas arvores, contendo em si as tres espheras com que vivem todos os animaes do mundo.

Com os peixes partilha o elemento d’agoa, com os homens e os quadrupedes o da terra, e com os passaros aninha-se e repousa nas arvores. Direi ainda que só parece