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porque lhe fora isso prohibido pelos espiritos, e se fizesse o contrario succeder-lhe-hia mal.

Considerae, leitor, a maldade, e o temor d’estes demonios, maldade para impedir que se cheguem os homens á luz da verdade, ficando sempre obedientes ás trevas da infidelidade.

É proprio da malicia fugir da claridade com medo de serem descobertas suas maldades, e sua autoridade destruida.

O temor, que elles tem, dos servos de Deos, em cuja presença não se podem sustentar, bem como o mocho diante dos raios do sol, e os sapos á vista da flor e cheiro da vinha, mostra quam grande é o poder de Deos, dado á sua igreja contra a potestade do inferno.

Prosigamos.

Dois principaes feiticeiros governavam duas nações de Tabajares, inimigas reciprocas, das quaes abusavam dizendo que tinham repetidas conferencias com os diabos tomando a figura de diversos passaros.

O feiticeiro do lado de Thion, mau e desgraçado (que nunca quiz vir á ilha, e que della desviava seos similhantes o mais que podia) criava em sua casa um morcego, a que chamava Endura, que lhe fallava em voz humana em lingua dos Tupinambás, algumas vezes tão alto, que podia ser ouvido á seis passos de distancia, não distincta, porem confusamente e com timbre infantil.

Respondia-lhe o selvagem ficando só em sua casa, porque despedia a todos quando percebia que elle lhe queria fallar.

Quando os nossos la foram afim de preparar os selvagens a sahir do seo paiz para a ilha, instigou-se a curiosidade de alguns francezes, que tinham ouvido dizer maravilhas d’este feiticeiro, e pediram a seos compadres que lhes dissessem o que percebessem do colloquio d’elle com o morcego, e para isso aproximaram-se de mansinho da morada d’elle a ponto de ouvirem perfeitamente a voz de ambos, e