XXVIII

Ronsard não é de parecer que estes homens, que lembram a origem do Mundo, percam sua feliz innocencia, e por isso insta com os visitantes para que não troquem a sua ignorancia pelos cuidados da civilisação.[1]

  1. Em geral não são conhecidos estes versos de Ronsard, derigidos ao fundador da França antarctica, a essa personagem voluvel, ora huguenote, ora fervoroso catholico; cujas severidades excentricas Lery evitou fugindo para as mais longinquas florestas:

     Douto Villegaignon, como te enganas! Tu pretendes em vão tornar ameno D’America o viver estranho e rude... Acaso não vês tu que a nova gente Tão nua é no trajar como no peito É nua de malicia? — que não sabe Ao vicio e á virtude o nome ao menos? — Que não sonha com Reis nem com Senados, E, isenta do temor, das leis ao jugo, Á mercè das paixões a vida passa? Ignoras, por ventura, que ahi mostra-se Cada homem de si livre senhor; e Leis, Senádos, Reis, em si resume? Não é a terra e o ar commum a todos? Vê-se, áquella, cobrir ferro importuno O seio virginal de longos sulcos?... Commum é tudo ahi, como dos rios São as aguas perennes que trasbordam Sem processo intentar de plena posse. Oh, não queiras, por isso, dessa gente O repouso turbar dos velhos usos! Si ha remorso em tua alma, em paz os deixa; Não procures, p’ra os campos estenderem. Ensinar-lhes á terra pôr limites! Choverão os processos, e a fraude Á amisáde terá então de unir-se! Logo após, d’ambição o duro espinho (Como a nòs acontece, desgraçados!) Tormento lhes será — negro, incessante. — Seu repouso não quebres: são felizes; Elles gosam na terra a edade d’oiro. (Traducção do Sr. J. T. de Souza.)