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Padre, não disse que queria fazer morrer o Padre-grande, e nem que lhe dei molestias.

Tambem não disse, que quero atormentar os Francezes, e fazer seccar suas plantas, porque não sou e nem fui feiticeiro, e assim quero ser filho dos Padres, quero voltar e trabalhar para elles, e si os deixei foi para colher meo milho: quero ir ja onde está o Padre-Grande, levar-lhe o meo milho, o meo peixe, e a minha caça, e dar-lhe um dos meos escravos para apaziguar o chefe dos francezes afim delle não crer no Cão grande, que sempre me quer mal embora eu seja seo irmão: muitas vezes me quiz matar, e si o Muruuichaue, quer dizer o «Principal dos Francezes» lhe der uma vez ordem de prender-me, elle me matará sem duvida alguma.

Por estas palavras conhecereis a indole d’estes selvagens, que não dizem a verdade quando necessitam defender-se.

Este miseravel Capitão, fugio e escondeo-se nos mattos, e depois foi para uma aldeia chamada Giroparieta, quer dizer aldeia de todos os diabos, ao pé da praia, e d’ahi enviou-me um dos seos parentes pedir-me paz, e que obtivesse do Maioral o seu perdão.

Mandou-me um seu escravo forte e robusto, bom pescador, e caçador: elle, sua mulher e mais pessoas da familia, me vieram ver, trazendo-me milho, peixe, e caça, e tanto elle como sua mulher muito fallaram para me persuadir de que eu não devia crer o que se dissesse d’elle, chamando os Tupinambás e o Cão-grande, — mentirosos e outros nomes feios, asseverando que era bom amigo, que desejava ser christão, e que si o Maioral, e eu tambem nos esquecessemos de tudo, elle e sua mulher regressariam contentes.