(VERSOS ESCRIPTOS NO ALBUM DE MANOEL DE ARAUJO).


Je veux changer mes pensées en oiseaux.
C. Marot.


Olha como, cortando os leves ares,
Passão do valle ao monte as andorinhas;
Vão pousar na verdura dos palmares,
Que, á tarde, cobre transparente véo;

Voão tambem como essas avezinhas
Meus sombrios, meus tristes pensamentos;
Zombão da furia dos contrarios ventos,
Fogem da terra, acercão-se do céo.

Porque o céo é tambem aquella estancia
Onde respira a doce creatura,
Filha de nosso amor, sonho da infancia,
Pensamento dos dias juvenis.
Lá, como esquiva flôr, formosa e pura,
Vives tu escondida entre a folhagem,
Ó rainha do ermo, ó fresca imagem
Dos meus sonhos de amor calmo e feliz!

Vão para aquella estancia, enamorados,
Os pensamentos de minh'alma anciosa;
Vão contar-lhe os meus dias mal gozados
E estas noites de lagrimas e dôr;
Na tua fronte pousaráõ, mimosa,
Como as aves no cimo da palmeira;
Dizendo aos échos a canção primeira
De um livro escripto pela mão do amor.

Dirão tambem como conservo ainda
No fundo de minh'alma essa lembrança

Da tua imagen vaporosa e linda,
Unico alento que me prende aqui.
E dirão mais que estrellas de esperança
Enchem a escuridão das noites minhas.
Como sobem ao monte as andorinhas,
Meus pensamentos voão para ti.