Os grandes da antiguidade, ou a Nobreza dos antigos, ainda era mais forte, e singular, que a que se ideou depois; uma, e outra têm de comum o serem efeitos da vaidade, e consistirem na imaginação de quem não cabe em si; a Nobreza porém do tempo heróico era em tudo mais subida; nem é para admirar, porque hoje nada é comparável à grandeza Esparciata, e ao esplendor Latino. Os séculos foram desfazendo todos os portentos; a variedade de sucessos, e fortunas também foi reduzindo o mundo a um estado de mediocridade; a mesma vaidade da Nobreza teve decadência; acabou-se a ficção, e desvario em que aquela sorte de Nobreza se fundava; ela foi um dos ídolos que caíram. Quando a luz da verdade desterrou as trevas do Paganismo, cessaram os Oráculos, não responderam mais, emudeceram. A Grécia, pátria comua dos Heróis, e donde estes nasciam como em terra fecunda, e própria, foi donde a vaidade da Nobreza quis elevar-se ainda acima das Estrelas. E com efeito Eneias dizia ser filho de Vénus, Aquiles de Tétis, Faetonte de Apolo, Alexandre, e Hércules de Júpiter. Estes, e outros muitos pretendiam não menos nobre origem, que a celeste, como descendentes dos Deuses imortais; esta fábula não durou um dia só; e é para admirar, que ela tivesse autoridade no conceito de homens polidos, sábios, e prudentes, e com tanta força que chegassem a fazer das fábulas, religião. Aquela foi a Nobreza dos antigos; Nobreza, que tinha por princípio, um engano introduzido, e respeitado. Via-se nas mãos de Júpiter o raio, nas de Marte a espada, e nas de Apolo as setas; Tétis dominava as ondas, Vénus a fermosura: quem havia resistir por uma parte à força do poder, e por outra ao encanto da beleza? Ainda quem conhecesse a fábula, se havia de namorar do aparato dela. Todos sabem que os homens são iguais, enquanto homens; mas nem por isso deixam de entender, que há uma nobreza que os distingue, e que os faz ser homens melhores.