O amor nasce da fermosura, e com ela morre; e assim como pode haver amor constante, se é tão pouco constante a fermosura? E se esta muda tanto, como pode ser que o amor não mude? Há três progressos em tudo quanto a natureza abraça: o primeiro é de crescer, o segundo de estar e o terceiro de diminuir; nesta lei também entra a fermosura: cresce, está e diminui. O amor fielmente segue a fermosura: não muda quando a fermosura cresce, não foge quando ela está, mas com ela diminui, e acaba. O tempo com um passo subtil, e disfarçado lentamente imprime na beleza o seu carácter; já começa a ser tíbia a luz dos olhos; já se mostra sem sabor o agrado, e já fica sem alma a mesma graça; acabou-se pois a fermosura, e apenas pode descobrir-se a sua ruína entre os mesmos sinais do seu estrago: tudo são riscos donde se vê como em padrões fatais escrita a impressão dos dias; tudo são concavidades, donde se mostra como em funesto exemplo gravado o rigor do tempo; essa imagem, desvelo que foi da idolatria, cuidado de atenções, e finalmente emprego que foi de tantos votos, já se vê sem altar, e sem veneração; e trocado o culto em vitupério, só ficou para objecto do desprezo; como se a idade fosse algum delito, ou fosse culpa o número dos anos: assim acaba a fermosura, assim acaba o seu império, e também assim, acaba o amor. O Sol nascendo no Oriente, vem cheio de beleza, e resplendor; por isso tudo são tributos, tudo admirações, e tudo amores: as fontes o festejam murmurando; as aves o anunciam com requebros, e as flores com o riso o lisonjeiam; mas depois de ter corrido (qual gigante) um caminho imenso; e depois que os resplandores se mudam no ocaso em pálido semblante, logo acabam os amores, as admirações e todos os tributos; na mesma tumba, em que se apaga a luz, também se extingue o aplauso; na mesma sombra, em que se encobre o dia, também se esconde o obséquio; e o respeito acaba nas mesmas ondas, em que faz naufrágio o Sol.