A Luis Piza Sob.o

É noite... O santo famoso,
O doce, o meigo São João,
Tivera um dia glorioso,
Dia de festa e de gozo,
Que encheu de estrondo o sertão.

Já cedo, em meio aos clamores,
Aos vivas do poviléu,
Lindo, enramado de flores,
Um mastro de quentes cores,
Subira em triunfo ao céu!

E agora, enquanto, alva e lesta,
Palpita a lua hibernal,
Na fazenda, toda festa,
Referve a alegria honesta
Da noite tradicional.

Dentro, com grande aparato.
Brilha, enfeitado, o salão:
Que há, nessa festa do mato,
Pessoas de fino trato,
Chegadas para o São João...

Destaca-se entre essa gente
A flor do mundo local:
O padre, o juiz, o intendente,
— O próprio doutor Vicente
Que é deputado estadual!

Ante o auditório pasmado,
Que, num enlevo, sorri,
A Isabelinha Machado
Batuta, sobre o teclado,
Uns trechos do Guarani...

Tudo o que toca e assassina,
Recebe imensa ovação;
Todos, quando ela termina,
Põem-se a exclamar: "Que menina!
Dá gosto! Que vocação!"

E ela, entre ingênua e brejeira,
Com ares de se vingar:
"Agora, queira ou não queira,
Seu Saturnino Pereira
Há de também recitar".

Surge. à força, o Saturnino...
Rugem palmas em redor!
É um tipo, esgalgado e fino,
Que sabe, desde menino,
Dizer Castro Alves de cor.

Na sala, muda e tranqüila,
Tombam, com chama, os versos seus;
E ele, o letrado da vila,
Ao som da velha Dalila,
Lá vai: "Foi desgraça meu Deus..."

Após ouvir a estupenda
Flamância do seu falar
No amplo salão da fazenda
Os velhos jogos de prenda
Reclamam o seu lugar.

Começa então a berlinda.
Risos. Cochichos. Zunzum.
— De pé, donairosa e linda,
Pergunta a D. Florinda
Os dotes de cada um:

Por que razão, seu Martinho,
Foi à berlinda a Lelé?
— Porque olha muito ao vizinho";
"Porque é má; porque é um anjinho";
"Porque é vaidosa"; "porque..."

E todo o mundo, à porfia,
Põe farpas na indiscrição...
E enquanto, ingênua e sadia,
Essa campônia alegria
Faz tumultuar o salão.

Lá fora, alegre e gabola,
Num terreiro de café,
Ao rude som da viola,
A caboclada rebola
Num tremendo bate-pé!

A filha do Zé Moreira
É o mimo deste São João;
À luz da rubra fogueira,
Requebra a guapa trigueira
Ao lado do Chico Peão.

Candoca, a noiva do Jango,
Baila num passo taful;
É a flor que, nesse fandango.
Tem lábios cor de morango.
Vestido de chita azul.

No sapateio se nota,
Aos risos dos que lá estão,
Nhô Lau, de esporas e bota,
Dançando junto a nhá Cota,
Viúva do Conceição...

Á voz do pinho que chora,
Por sob a paz do luar,
Frenindo vai, noite afora,
Essa alegria sonora
Da caboclada a bailar!

E do salão, que ainda brilha
Num faiscante esplendor,
Chegam os sons da quadrilha,
Que alguém ao piano dedilha
Com o indomável furor.

E no sarau campesino,
Nessa festa alegre e chã.
Ruge a voz do Saturnino,
Que grita, esgalgado e fino:
"Balancez! Tour! En avant..."