A sala, em que Henrique ficou esperando, era toda mobilada com pesadas cadeiras de couro lavrado e alto espaldar, mesas de pés em espiral, e pelas paredes alguns ennegrecidos retratos de frades, pertencentes provavelmente aos antigos proprietarios do mosteiro.

No momento em que o velho servo, que era uma especie de feitor honorario da casa, abriu outra porta da sala, para ir annunciar á familia a visita de Henrique, chegaram aos ouvidos d’este, de mistura com um tinir de louças e de crystaes, as vozes e risos de creanças, que falavam ao mesmo tempo. Com a entrada do velho produziu-se um certo silencio, e após uma voz de mulher, de timbre fresco e agradavel, disse audivelmente e como em resposta ás palavras do criado:

― Ora as etiquetas com que esteve, Torquato! Mande entrar para aqui.

O feitor parece que resmoneou não sei o quê, a que ainda a mesma voz redarguiu:

― O que não é bonito é fazel-o esperar. Ande, vá.

Torquato ― chamemos-lhe assim, visto que assim lhe chamaram ― appareceu outra vez e fez signal a Henrique, de que o esperavam na sala immediata.

Henrique que presentiu ir achar-se na presença de uma mulher nova e porventura bonita, correu, com instincto de perfeito homem de côrte, os dedos pelos cabellos, afagou o bigode, ageitou rapidamente o laço da gravata e entrou.

Era completo o contraste d’este aposento com o primeiro; transpondo aquella porta dissipava-se todo o perfume antigo, todo o caracter de vetustez, que até alli reinava em tudo. Era moderno o estuque do tecto, modernissimo o papel que forrava as paredes, e a mobilia toda de um cunho de actualidade, visivel aos olhos menos pesquizadores. Como para tornar mais frizante o contraste, a presença do velho feitor estava aqui substituida por a de