― Esta manhã ― proseguiu Henrique, a quem os encantos d’aquelle gesto não tinham passado despercebidos ― assisti a uma scena commovente. O logar era uma deveza; uma joven senhora... joven e... e com outras qualidades, além d’esta, para excitar attenções, lia, em voz alta, as cartas que algumas pobres mulheres do povo acabavam de receber pelo correio...

Ella não o deixou continuar.

― Ah! entendo agora. Viu-me? Já andava por fóra? Não o suppunha assim madrugador. Mas onde estava tão escondido? Vejo que é indiscreto... Não admira, habitos da cidade. É verdade, é. Aquella gente encontrou-me no caminho quando eu voltava de uma visita a uns parentes pobres, e não me deixou sem que eu lhe abrandasse a ancia de coração que a affligia. Coitados! Que havia eu de fazer? Diga-me, já pensou no supplicio que deve ser olhar a gente para uma folha de papel escripta, na qual sabemos que se fala de uma pessoa querida, e não ter poder para decifrar aquelle enygma? Que martyrio! Eu por mim, confesso que me falta o animo para recusar pedidos d’aquelles, como me faltaria para negar uma gotta d’agua ao desgraçado que visse a morrer de sêde. A crueldade seria quasi igual. Não lhe parece?

Henrique formulou um galanteio, que ella porém não ouviu, entretida já a escutar o que uma das creanças lhe dizia.

― Lena, olha a Annica, que está a deitar a sôpa d’ella no meu prato.

― Deixa falar, Lena, deixa falar, foi ella que primeiro a deitou no meu. Não tem vergonha de mentir!

― Então ― disse Magdalena, que a este nome correspondia a contracção familiar, de que se serviam as creanças. ― Olhem agora se teem juizo. Vejam se querem que eu vá dizer á mamã que venha para aqui.