Tinha junto à porta uma frondosa sucupira, única árvore de algum vulto que se notava naquela paragem. A sucupira diz-se que tem a propriedade de atrair o raio, mas Gonçalo dizia sorrindo:

— Nada no mundo desafia mais os raios da cólera celeste do que o pecado, e eu sou o maior dos pecadores.

De feito depois da morte de Gonçalo o raio derribou aquela árvore, que o céu parecia ter respeitado somente enquanto prestava uma sombra ao piedoso eremita. Junto à cabana havia também um cercado, que Gonçalo amanhava com suas próprias mãos cultivando algumas flores, com que enfeitava os altares da Virgem; e era esta ocupação a única distração que concedia aos rigores de sua vida ascética e solitária.

Ali assentados em um grosso madeiro estendido junto à porta da cabana pelo lado de fora os romeiros de Vila Boa escutavam com a maior atenção da boca de Gonçalo os acontecimentos que ficam referidos nesta história, desde o desaparecimento de Gonçalo até o temeroso e estranho duelo em que matou Inimá, ficando ele salvo por uma espécie de milagre. Ele lhes contava com todos os pormenores suas longas peregrinações e trabalhos, as lutas e dificuldades que tivera a vencer durante o tempo em que, homiziado pelos desertos, se refugiava entre os selvagens procurando sufocar por meio de uma vida inquieta e