Os clerigos, em geral, levavam uma vida, sinão dissoluta, pelo menos escandalosa, pois que a regra do celibato continuava a ser imposta pela Curia Romana aos bispos e parochos que o Estado considerava funccionarios civis segundo o Acto Addicional. O governo da Regencia, neste ponto inspirado pelo padre Feijó, achava, e o ministro dos negocios estrangeiros, Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho, o declarava em nota do anno de 1834 ao representante da Santa Sé no Rio de Janeiro, que os soberanos, nos seus respectivos Estados, podiam alterar a seu bel-prazer, em beneficio dos seus subditos, pontos de disciplina como era o celibato clerical, «o qual o governo sabia que não existia de facto, favorecendo enormemente tal estado de coisas a immoralidade publica»[1]. De principios politicos geralmente muito adiantados, esses padres desempenhavam papel importante nos partidos, quer como eleitores, quer como parlamentares, figurando em numero de 23 na legislatura de 1834-37, mestres, portanto, em intriga eleitoral e parte avultada dos debates da Camara e do Senado.
As ordens monasticas não tinham sido abolidas no Brazil como o foram em Portugal, em 1833, pela dictadura liberal, em satisfacção ás idéas philosophicas da Revolução e em represalia do apoio prestado ao Rei absoluto. Não gozavam, porem, de inteira liberdade de acção, a qual se lhes foi restringindo pelo tempo adiante, desde a annullação em 1830 de alienações de bens por ellas realizadas sem auctorização do governo até a suspensão em 1855 do noviciado, pendente o seu restabelecimento da celebração da Concordata com a Santa Sé. A Egreja era em muitos pontos serva do Estado, estando o clero sob sua alçada em materia de doutrina e de culto, como o expõe a pastoral collectiva do episcopado brazileiro de 19 de Março de 1890, apoz a separação, pelo Governo Provisorio da Republica da Egreja e Estado. Por longo tempo entretanto o clero brazileiro parecera accomodar-se perfeitamente com o regalismo, não levando
- ↑ Documento reproduzido no artigo de Basilio de Magalhães — D. Pedro II e a Egreja, n'O Jornal de 2 de Dezembro de 1925.