que, hão de reunir-se, formando uma pyramide eterna, ou tom- barão esmagando os operarios ! Penso eu (e este pensamento pare- ce-me digno de ser a divisa de todos aquelles que trabalham no magnifico edificio da arte nacional), penso eu que o presente deve ser preparador do futuro ; e que é dever de quantos teem poder e intelligencia, qualquer que seja a sua vocação e o seu posto, do poeta tanto como do estadista, apagar essas raias odiosas, e comba- ter os preconceitos iniquos que se oppoem á emancipação completa de todos os individuos nascidos nesta nobre terra. Essa grande re- volução, infallivel porque é logica, triumphante porque é santa, não ha de ser contemplada pelos mais mancebos de hoje ; restar-nos-ha porém a gloria de haver-lhe aplainado o caminho.

Não será dramatico desenrolar a velha bandeira do Ypiranga, e nella apontar como antithese monstruosa a nódoa negra da escra- vidão, verme nojoso que róe a flôr de nossas liberdades ? Não será dramatico mostrar o que fizeram nossos pais, e o que nós temos a fazer para coroar sua obra ?

Foi possuido desta idéa que eu utilizei os bellos dias de Janeiro do anno passado, escrevendo o drama–SANGUE LIMPO. Encetando uma empreza que me parece de alta moralidade, e que outros comple- tarão mais efficazmente, aggredi as preoccupações que existem contra os homens de côr. Bem sei que a execução não está á par da idéa ; balbuciei uma lingua nova para mim, e o meu enthusiasmo juve- nil extravasou por vezes dos moldes frios e inflexiveis do drama moderno. Julgo porém haver attingido o meu fim. Só ao genio é dado começar pelo irreprehensivel.

Poetas, artistas, cultivadores do bello, semeadores incognitos do futuro, não esmoreçamos. Esta épocha vai rica de materialismo, de descrença e de ignominias politicas : mas um dia erguer-se-ha o sudario gelado desta nova Pompeia; e do cadaver só subsistirá o cràneo, séde da intelligencia !


1.º de Setembro de 1862.