Segundo os direitos que as leis naturais conferem aos sêres, não e crime sem absolvição, amar com veemência quando o destino quiz fazer chegar a hora das incendiárias paixões. Não é crime sem atenuante renunciar ao privilégio das castas para fixar num humilde uma dedicação de sentimentos.
Se uma existência de renome cercada de prestigios, de inteligência, embelezada pela graça que dão as ideais inspirações, se enamorou de uma pessoa obscura, é que muita coisa de afim, de irresistivel, de gémeo, a dominou e atraiu. Mas se o amor, não conhece cadeias, se transpõe abismos, se arreda escólhos, se não o detem privilégios de castas, nem preconceitos de gerarquias, e, rompendo estôrvos e grilhetas, navega en oceano revolto, como Leandro transpondo em noites sinistras os mares agitados de Trácia, para nadar na ventura do amor de Hero que todas as noites o aguardava na tôrre de Sestos; acima do amor que è gôso, volúpia, delirio e exaltação, há outro sentimento mais belo, mais estoico, mais sublime que se chama Dever.
Se loucas de amor as criaturas passam por doidas da razão; se dessa classificação lhes vem o sofrimento de vitimas, só o dever as pôde converter em heroínas.
Que belo seria que aquela que não sendo doida, é antes vítima, pudesse figurar na historia das tragedias humanas na gloriosa apoteóse de Heroina!
Sonhei, em tudo que digo, um sonho irrealisável? Deixem-me sonhar mergulhada num sonho de perfeição.