Quem é o poeta? (perguntei eu uma vez á minha alma) esse genio pensador e quasi sempre triste? e ella respondeu-me: ― E' aquelle que desprende a idéa da terra e adeja pelas regiões ethereas em busca da visão de seus sonhos, d'um ente idéal que não pode encontrar na terra e que se o encontrou não o soube comprehender!..
E' aquelle que ama a naturesa em toda a sua magestade que deixa muitas vezes o bulicio do mundo pela solidão dos bosques que se deleita contemplando o firmamento que ama ver a lua reflectida no mar, o sol quando desponta radeante e bello e quando ao cahir da tarde esconde seus tibios raios no sio do oceano; o que ama ouvir o ruido das vagas, sentado nos rochedos quando a praia está deserta. O que se apraz de ver as lagrimas que a rosea aurora deposita nos calices das flôres e que depois lhes sorve o astro do dia desabrochando-as puras e formosas.
E' aquelle que estende o pensamento da terra á eternidade e que procura entre cyprestes os tumulos isolados que lhe revelam o nada da existencia e o pó a que se reduzem o rico e o pobre!.. aprendendo alli a despresar as grandesas que ostenta um mundo vã! E' aquelle que quando ouve o rebombar dos trovões, em meio da tempestade, mais ama e admira a Divindade, por que se recorda do Sinai, a onde precedido por formidavel trovão fallava Deus a Moysés.
E' aquelle que allivia suas magoas soltando sentidos cantos ao som d'uma harpa triste e saudosa. Aquelle que é muitas vezes escarnecido por genios boçaes e demasiado prosaicos...
E' aquelle de quem o canto livre e isento de lisonja e adulações, não prostitui a lyra a paixões sociaes, nem ao vil interesse.
E' aquelle que exprime seus cantos tão puros como o coração lh'os inspira. Aquelle que prefere uma folha de louro a um futil titulo, ou a um thesouro valioso.
E' finalmente aquelle que não póde conter occulto o genio ardente que lhe trasborda no seio e que lhe brada — á gloria!.. e após a morte!..
Maria Adelaide Fernandes Prata.