O velho mostrador da sala de jantar deu meia-noite, uma hora, e Maria do Carmo ainda estava acordada, a pensar no Zuza, arquitetando frases para responder ao futuro bacharel em ciências jurídicas. Porque o estudante, como suspeitou o amanuense, achara meio de comunicar-se com a rapariga, atirando-lhe uma cartinha por baixo da mesa, quando jogavam o víspora.

Era a primeira vez que o Zuza lhe escrevia numa letra caligráfica, de mulher, miudinha, igual e redonda. Ao apanhar o envelope, com um movimento disfarçado, Maria sentiu o sangue afluir todo para o rosto, como se todo o mundo a tivesse surpreendido em flagrante às barbas do padrinho. Ela mesmo, depois, admirou a sua coragem, ela que nunca desrespeitara o amanuense, temen­do-o como a seu pai. Não pôde reprimir um susto, ficou fria, com os olhos baixos, sem prestar atenção ao jogo. Pareceu-lhe ver através dos óculos escuros do padrinho um lampejo de cólera concentrada. Tremia com o papel na mão, sem saber o que fizesse. Mas o víspora continuava animado e ela pôde cautelosamente guardar o objeto querido, pretextando sede e levantando-se para beber água no interior da casa. Guardou-o bem guardado, no fundo de uma caixinha de fitas, sem ler, e voltou imediatamente ao seu lugar com um alívio, muito lépida.

Quando o amanuense entrou a esbravejar contra o Zuza, esmurrando a mesa, batendo portas, colérico, medonho, Maria ficou lívida! Ta, ta, ta, ta, ia tudo águas abaixo, o seu “crime” ia ser descoberto, não havia fugir. Estava irremediavelmente perdida! Enfiou pelo corredor com as mãos na cabeça, aflita. Decididamente o padrinho ia expulsá-la de casa... seu primeiro ímpeto foi voltar, atirar-se aos pés de João da Mata e pedir-lhe, suplicar-lhe por amor de Deus, por quem era que a perdoasse, que fora uma fraqueza, uma crian­cice... Isto, porém, seria complicar a situação, confes­sar-se culpada, entregar-se à cólera do amanuense. E ao sentar-se à mesa de jantar foi acometida por uma convulsão de choro mudo, com a cabeça entre as mãos, cotovelos fincados na mesa, olhos fixos na luz moribunda da velinha de car­naúba.

O padrinho berrou, jurou acabar com “a ban­dalheira”, disse horrores do Zuza, e, afinal, que felicidade para a rapariga! foi se deitar com a mulher. Maria suspirou forte como se lhe tivessem tirado um grande peso do coração; e agora, só no seu quarto, lia e relia a carta do acadêmico, muito à fresca, sentindo um bem-estar confortável na sua rede de varandas, branca e sarapintada de encarnado.

Fazia calor.

Maria costumava dormir com a vela acesa, numa palmatória de flandres. Noutro quarto, defronte, ressonava a cozinheira, uma tirando para velha, chamada Mariana, e, no corredor, o Sultão abanava as orelhas sacudindo as pulgas. De quando em quando havia um barulho de asas na sala de jantar: era a sabiá debatendo-se na gaiola, assombrada.

Agora, sim, Maria estava só, completamente só, podia ler à vontade, uma, duas, três... quantas vezes quisesse, a carta do Zuza. Nada como a noite para os namorados! Era só quando ela gozava a sua liberdade, à noite, no seu quarto, em camisa, fazendo o que bem entendesse...

“Minha senhora”, dizia o futuro bacharel, muito respeitoso. “Tomo a liberdade de me dirigir a V. Exa. confiado na sua infinita bondade, nessa bondade que se revela em seus esplêndidos olhos de madona e na brandura meiga de sua voz cujo timbre faz-me lembrar toda a melodia duma harpa eólia tangida por mãos de serafins... Tomo esta liberdade para dizer-lhe simplesmente que a amo! e que este amor só podia ser inspirado pela incomparável luz de seu olhar e pela música sentimental de sua voz... Amo-a deveras... Só me resta esperar que V. Exa. aceite este amor como tributo sincero de um coração avassalado por sua beleza encantadora, e então serei o mais feliz dos homens.

D. V. Exa. adm. e escravo

José de Souza Nunes”

Isto numa letrinha microscópica, indecifrável quase.

Maria esteve meditando muito tempo sobre a resposta que devia dar ao estudante, com os olhos na parede onde esbatia a sombra da rede ao comprido. Para não responder ficava-lhe mal, era uma falta de consideração. Devia responder fosse o que fosse. E, nessa dúvida, lia e relia a carta numa inquietação que lhe tirava o sono. Realmente! começava cedo a sua carreira amorosa e começava por um aspirante a bacharel! Seria verdade aquilo ou o rapaz queria divertir-se à sua custa? O Zuza parecia-lhe um bom moço, muito bem-educado, incapaz de seduzir uma rapariga honesta, de costumes irrepreensíveis, refratário a pagodeiras... Às vezes, porém, tinha cara de pedante com os seus óculos de ouro, com a sua flor na botoeira, dizendo que dê, dê-me você isto, faça você aquilo, ora sebo!

Maria implicava com certos modos do rapaz.

É verdade que tinha fortuna, era filho dum homem de bem, dum coronel... Mas...

E lá vinha o mas, e a dúvida não se desfazia.

Imaginava-se ao lado do Zuza, numa casinha muito bem mobiliada, com cortinas de cretone na sala de jantar e um viveiro de pássaros — ele, de chambre e gorro sentado na escrivaninha a fazer versos, feliz, despreocupado; ela com um robe-de-chambre todo branco, fitinhas na frente de alto a baixo, cabelo solto, a ler o último romance da moda, recostada na espreguiçadeira, sem filhos... Que vida!

Ao mesmo tempo lembrava-se de que o Zuza podia lhe sair um marido muito besta e casmurro, cuidando somente da papelada de autos e requerimentos, um advogado com escritório e tabuleta à porta para fazer... nada! Ela, por outro lado, a cuidar dos filhos, muito besuntada, da sala para a cozinha numa azáfama de burguesinha reles. Boas!

E não assentava idéias, a mente que nem um rodopio, fantasiando situações disparatadas, coisas impossíveis.

Leu outra vez a carta, analisando-a palavra por palavra, repetindo as frases à meia voz. Aquela ­linguagem alambicada e dengosa quis-lhe parecer tosca demais para ter sido do punho dum estudante de direito. — Que idiota! pensava; comparar seus olhos com olhos de madona e sua voz com uma ­harpa eólia! — E, num arrebatamento, levantou-se e guardou a carta na caixinha de fitas. — “Qual olhos de madona! Qual harpa eólia, qual nada, seu besta!”

Daí a pouco também ressonava com a respiração leve como uma carícia.

O dia seguinte era domingo. Todos em casa do amanuense acordaram muito bem-dispostos. Havia missa cantada na Sé. Espocavam foguetes e repicavam sinos. Meninos apregoavam numa voz cantada a Matraca a 40 réis! — um jornaleco imundo que falava da vida alheia e que por duas vezes trouxera sujidades contra João da Mata. Maria do Carmo quis ver o que dizia a Matraca, apesar de o padrinho ter proibido expressamente a entrada do pasquim em sua casa. Ali só lhe entrava a Província, dissera ele; isso mesmo porque o José Pereira não exigia pagamento de assinatura. O mais era uma súcia de papéis nojentos que só serviam para... — Maria deu um pulo até a casa da viúva Campelo e aí pôde comprar a Matraca. O padrinho estava no banho. — O Namoro do Trilho de Ferro! gritavam os vendedores. Maria teve um palpite. Certo aquilo era com ela. Que felicidade o padrinho estar no banho! Pagou ao menino, pedindo-lhe pelo amor de Deus que não gritasse mais o Namoro do Trilho de Ferro. Abriu o jornal ansiosa. Que horror! Havia, com efeito, uma piada sobre ela e o Zuza. Mais que depressa correu a mostrar à Lídia.

— Estás vendo, menina? Lê isto aqui. E apontou com o dedo.

Eram uns versos de pé de viola que contavam o recente namoro do Zuza:

“A normalista do Trilho,
ex-irmã de caridade,
está caída pelo filho
dum titular da cidade.

O rapazola é galante
e usa flor na botoeira:
D. Juan feito estudante
a namorar uma freira...

Eis por que, caros leitores,
eu digo como o Bahia:
Falem baixo, minhas flores,
Senão... a chibata chia!...”

......................................................................................

Lídia achou graça na versalhada. Ela também já saíra na Matraca.

— Um desaforo, não achas? perguntou a nor­malista indignada.

— Que se há de fazer, minha filha? Ninguém está livre destas coisas no Ceará moleque. Não se pode conversar com um rapaz, porque não faltam alcoviteiros. Olha, eu aposto em como isto que aqui está saiu da cachola do Guedes.

— Que Guedes?

— Ó mulher, o Guedes, um do Correio... Dizem até que está feito redator principal da Matraca.

— E que mal fiz eu a esse Guedes que nem sequer me conhece?

— Eu te digo. O Guedes andou a querer namorar-me. Chegou a escrever-me uma carta muito errada e piegas, pedindo uma entrevista... Que fiz eu? Ri-me muito das asneiras do bicho, troceio-o a valer e mandeio-o pastar bem... Ora, o Guedes sabe que nós somos muito amigas e talvez queira vingar-se indiretamente. Aí está o que é, menina. Manda-o plantar couves e rasga esta baboseira, que isto não vale senão nada.

— Não vale nada, mas toda a gente lê e acredita, é o que é.

— Sabem lá qual é a “normalista do Trilho”!

A propósito Maria contou as ocorrências da véspera, a carta do Zuza, a cólera do padrinho, muito vexada.

Estavam à janela, em pé, frente a frente. D. Amanda andava para os fundos da casa a mourejar. No fim da rua, do lado da Estrada de Ferro, uma locomotiva fazia manobras, chiando, a deitar vapor fora. Chegou até a frente da casa da viúva, soltou um guincho rápido e voltou estralejando sobre os trilhos.

...E os sinos a repicarem na Sé e girândolas de foguetes estourando no ar. Chegavam espaçados sons de música que o vento trazia.

— Não sei se deva responder, disse Maria dando a carta à amiga. Ele com certeza vem hoje para o víspora...

— De forma que tens um compromisso a satisfazer...

— Compromisso?

— Sim, porque quem cala consente. Aceitaste a carta, agora é responder. Diz-lhe que o amas também e que desde já o consideras teu noivo. Nisso de amor quanto mais depressa melhor. Eu pelo menos o entendo assim. Queres, eu faço a mi­nuta.

— Eu, escrever para um homem?

— Tola! Que crime há nisso? Eles não escrevem para nós? Olha, tolinha, não sejas criança. O homem foi feito para a mulher e a mulher para o homem.

— Mas...

— Não tem mas nem meio mas. Decide-te a namorar o rapaz e deixa-te de meninices. Tu é que tens a lucrar. O Zuza tem fortuna, está a formar-se e com mais um ano pode ser teu marido e fazer-te muito feliz.

O que é que esperas de teu padrinho, um sujeito estúpido e usurário como um urso? Já não tens pai nem mãe e ele já fala em tirar-te da Escola. É muito homem para botar-te a cozinhar. Não sejas tola!...

Lídia interrompeu-se para cumprimentar um cavaleiro que passava. Era o Zuza montado num alazão reluzente ao sol, de cauda aparada e ar­reios de prata. O estudante trajava flanela e meias-botas de polimento, chapéu castor desabado, uma grande rosa branca no peito, luva, rebenque, muito vistoso com seus óculos de ouro e seu bigodinho retorcido para cima.

Fazia o costumado passeio matinal e lembrara-se de passar à porta do amanuense. Cumprimentou rasgadamente a Campelinho. Maria ocultou-se envergonhada atrás do postigo olhando por entre as gretas.

— Adorável! fez Lídia. E tu ainda queres mais, hein, minha tola?

Como sentia não ser ela a querida do Zuza! Ambos com vinte anos de idade, encarando a vida por um mesmo prisma: passeios a cavalo, toaletes de verão e de inverno, como nos figurinos, com chácara no Benfica, um faetonte para virem à cidade, vacas de leite... Um maná!

Tinha “o seu”, o Loureiro, mas o guarda-livros parecia-lhe muito casmurro, muito indiferente a essas coisas de bom gosto, aos requintes da vida aristocrática que ela ambicionava tanto. Queria-o mais por um capricho, porque não encontrava outro homem em melhores condições que desejasse casar com ela. Sabia de sua má fama e agarrava-se ao Loureiro como a uma tábua de salvação. Tudo menos ficar para tia. Verdade, verdade, o Loureiro não era um sujeito ignorante e pobre que lhe fizesse vergonha; mas não tinha certo aprumo, certa elegância no trajar; aferrava-se à calça e ao colete branco, invariavelmente, e ninguém o demovia daquele velho hábito. Entretanto possuía seu cabedal em casas e apólices da dívida pública. Ao passo que o outro, o Zuza, sabia empregar seu dinheiro divertindo-se, trajando bem, passeando como um príncipe. Uma simples questão de temperamento.

— Atira-te, minha tola. Aproveita enquanto o Brás é tesoureiro...

— Que queres tu que eu faça?

— Escreva logo essa carta e faze como eu: marca o dia do casamento. Assim é que se faz. Quem pensa não casa, lá diz o ditado, e é muito certo.

A voz de D. Terezinha chamou a Maria do outro lado da rua. Era hora do almoço. O amanuense estava apressado porque tinha de ir à praia, ao embarque do conselheiro Castro e Silva que seguia para o Rio de Janeiro.

João da Mata almoçou às carreiras, como quem vai tomar o trem, e abalou, enfiando-se no insepa­rável e já velho chapéu-chile.

Seriam onze horas pouco mais ou menos. Um mormação de fornalha abafava os transeuntes que desciam e subiam a rua de Baixo a pé, esbafo­ridos.

No porto havia grande lufa-lufa de gente que embarcava e desembarcava simultaneamente, bracejando, falando alto. A maré de enchente, crispada pela ventania de sudoeste, num contínuo vaivém, alagava o areal seco e faiscante. Gente muita ao embarque do conselheiro. Curiosos de todas as classes, trabalhadores aduaneiros de jaqueta azul, guardas de Alfândega e oficiais de descarga com ar autoritário, de fardeta e boné, marinheiros da Capitania, confundiam-se numa promiscuidade interessante. Jangadeiros, arregaçados até aos joelhos, chapéu de palha de car­naúba, mostrando o peito robusto e cabeludo, iam armando a vela às jangadas. A cada fluxo do mar havia gritos e assobios. Um alvoroço! Jangadas iam e vinham em direção do Nacional, que tombava como um ébrio, aproado ao vento. Apenas quatro navios mercantes fundeados e uma canhoneira argentina. Reluzia em caracteres garrafais, pintadinhos de fresco na popa duma barca italiana — “Civita Vecchia”.

O vapor apitou pedindo mala. Era uma maçada ir a bordo com a maré cheia e um vento como aquele. Demais o sol estava de rachar. Um carro parou à porta da Escola de Aprendizes marinheiros: era o conselheiro, metido numa sobrecasaca muito comprida, cheia de atenções. Já o esperavam os amigos receosos de que o vapor não suspendesse sem “o homem”.

A música da Polícia, formada à porta do quartel, gaguejou o Hino Nacional e o conselheiro, cheio de si, cortejando à direita e à esquerda, muito ancho, seguiu a tomar o escaler da Alfândega.

— Pílulas! fez João da Mata limpando a testa. Não vale a pena a gente se sacrificar com um calor deste!

Lá adiante encontrou o Loureiro, que vinha de despachar uma fatura no Trapiche, muito apressado com a sua calça branca lustrosa de gomas sem uma dobra.

— “Por ali?” — “É verdade, tinha ido a ne­gócio.”

— Que há de novo? tornou o Loureiro.

— Nada. Vou aqui ao embarque do conse­lheiro.

— Hás de ganhar muito com isto...

— Que queres, filho? A política, a política...

— Qual política, homem! Com um solão deste não havia quem me fizesse ir a embarque de filho da mãe nenhum.

Uma lufada de poeira redemoinhou a dois ­passos dos interlocutores derribando bruscamente o chapéu do amanuense, pondo-lhe a calva à ­mostra.

— Com os diabos! vociferou João da Mata abaixando-se mais que depressa para apanhar o seu chile que rodava sobre as abas numa disparada vertiginosa por ali afora.

— Fiau! fiau! Pega! pega! prorrompeu a garotada numa vaia estrepitosa de gritos e asso­bios.

— Canalha! resmungava o homem, enquanto o Loureiro escafedia-se daquela situação grotesca, sacudindo com a ponta dos dedos a poeira do paletó, muito calmo.

O conselheiro tinha chegado ao trapiche com o seu préstito oficioso de amigos.

O amanuense encavacou deveras — “Diabos levem conselheiros e tudo!” dizia ele mal-hu­morado, piscando os olhos desesperadamente por trás dos óculos escuros, cobrindo a calva com um lenço para não constipar. E dali mesmo voltou à casa maldizendo-se por haver deixado os seus cômodos por uma estopada inútil daquela.

Dava meio-dia. À porta do quartel de linha um soldado soprava a todo pulmão numa corneta muito bem areada.

João da Mata caminhava devagar, automático, como quem vai com uma idéia fixa. Que séca! Podia muito bem estar em casa àquela hora, metido na sua camisola fresca, de papo para o ar na rede, ao aconchego morno da afilhada, saboreando-lhe o cheiro bom das carnes; entretanto ali vinha ofegante como um boi e suado como dois burros, todo emporcalhado de poeira, furioso. Não lhe contassem para outra. Já tinha pensado mesmo em abandonar para sempre a política. Pílulas! Mal lhe chegava o tempo para pensar na Maria do Carmo, naquela deliciosa boquinha fresca e rosada, boa para a gente levar a vida inteira a beijar...

O Zuza tinha-lhe acordado o instinto; receava agora que a menina se deixasse levar pelas gabolices do estudante e então lá se iam os seus belos projetos águas abaixo.

Nunca se preocupara tanto com Maria do Carmo. Desde que o Zuza começou a freqüentar a rua do Trilho não lhe saía mais da cabeça a afilhada. A própria D. Terezinha por vezes tinha estranhado os seus modos para com a menina.

Achava a Teté uma mulher gasta: queria uma rapariga nova e fresca, cheirando a leite, sem pecados torpes, a quem ele pudesse ensinar certos segredos do amor, ocultamente, sem que ninguém soubesse... Estava farto do “amor conjugal”. Nunca experimentara o contato aveludado de um corpo de mulher educada, virgem das impurezas do século. E quem melhor que Maria do Carmo, uma normalista exemplar e recatada, poderia satisfazer os caprichos de seu temperamento impetuoso? Era sua afilhada, mas, adeus! não havia entre ele e a menina o menor grau de consangüinidade, portanto, não podia haver crime nas suas intenções... Se Maria houvesse de cair nas garras de algum bacharelete safado fosse ele, João da Mata, o primeiro a abrir caminho...

Demais, argumentava de si para si, podia arranjar tudo sem que ninguém soubesse. O segredo ficaria entre ele e a afilhada, inviolável como a sepultura de um santo.

E ia parafusando num meio simples e natural de conquistar o coração de Maria. — Toda a questão era de oportunidade.

Àquela hora a normalista arrastava ao piano a valsa Minha esperança, cuja cadência punha uma monotonia irritante na quietação morna da rua do Trilho.