Com aqueles olhos doloridos e agonizantes, que dormiam e acordavam de minuto em minuto na pálida alcova daquele rosto moreno, Dona Casemira tornara-se o culto da graciosa cidade nortista. Cabelo partido ao meio, e repuxado sobre o crânio como o de Rosita Rodrigo, toda ela era simplicidade elegante, singeleza tenteadora, um misto, enfim, de candura e de pecado. Casada aos dezoito, fora-lhe o marido para o Amazonas dois anos depois, não voltara mais. E estava já com vinte e quatro, quando os homens, que não eram seu marido, começaram a rondar-lhe a casa modesta, transformando-a, de refúgio da miséria, em secreto manancial de fartura.
Em breve, toda a gente em Fortaleza sabia da mudança operada, repentinamente, na vida da Casemira. Às olheiras pela renúncia haviam sucedido as olheiras pela abundância. E eram essas olheiras, exatamente, que enganavam frei Manoel da Pacificação, superior dos Carmelitas, o qual não se cansava de dizer, com a piedade no coração:
— É uma santa, a Dona Casemira; uma verdadeira santa!
Por três anos as beatas ouviram, sem protesto, aquele elogio do frade. Até que, um dia, à sua repetição, à porta do confessionário, uma resolveu protestar:
— Santa, não, frei Manoel! Isso é até um sacrilégio! Toda a gente sabe que Casemira vive hoje, ora com um, ora com outro!
Frei Manoel era, porém, desses homens teimosos, que nunca se deixam converter.
— Pois, é por isso mesmo que eu a chamo santa, filha! — exclamou, par não dar as mãos à palmatória.
— Diga-me uma coisa: a pia dágua-benta é santa?
— É, sim, senhor, frei Manoel, — confirmou a devota.
E o frade, vitorioso:
— E a pia não é um lugar onde todos metem o dedo?