A difícil questão imobiliária

Compra e troca sempre gera suspeita

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Prefeitura historicamente encontra dificuldades quando compra ou desapropria terrenos para obras

As confusões em torno da aquisição de uma área para o novo cemitério em 2006 não foram nenhuma novidade no histórico de brigas, denúncias, trocas de acusações e principalmente uma terrível demora para finalmente concretizar as obras previstas.

A Câmara de Cascavel está agora nos últimos retoques e a obra será inaugurada em breve. Mas houve tempo em que o prefeito fechava a Câmara e não a deixava funcionar (década de 60). O legislativo teve que funcionar em prédio emprestado (pelo Colégio Rio Branco, do professor Antônio Cid, depois do incêndio da Prefeitura) ou em prédio alugado, como agora. Mas a situação mais estranha ocorrida com a Câmara de Cascavel foi, certamente, a enorme dificuldade para regularizar legalmente o terreno em que se encontrava a antiga sede da Câmara, diante do Colégio Marista.

A área sempre foi pública, mas a certa altura vários terrenos (especialmente os que se localizavam na avenida Brasil), foram vendidos a terceiros, dados de presente ou misteriosamente registrados em nomes de manda-chuvas na cidade, como ocorreu com imóvel em que futuramente seria construída a Câmara, na rua Paraná, conjunto de salas em que funcionaram em épocas diversas, dentre outros órgãos, a própria Câmara, a 15ª Brigada de Infantaria Motorizada e o Fórum da Justiça estadual.

Confusão inexplicável

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Embora a coisa tenha acontecido na década de 50, foi preciso a eleição de um vereador ligado ao mercado imobiliário – Victório Moretti – para destramar o nó da situação absurda: a Câmara sem poder regularizar uma área que sempre pertenceu ao Município, porque doada pelo Estado em 1951.

Moretti entrou para a história ao ser o único vereador a renunciar em 1981, em protesto contra a prorrogação dos mandatos dos prefeitos e vereadores, determinada pela ditadura militar, que tentava evitar a redemocratização do país dificultando ao máximo os processos eleitorais.

Moretti descobriu que o imóvel da Câmara Municipal estava irregularmente escriturado em nome do ex-delegado de polícia Aroldo da Cruz e sua esposa Léa, abrindo uma luta intensa para finalmente obter a regularização. Deu-se como fato que o imóvel da Câmara havia sido equivocadamente e não dolosamente escriturado em nome da família Cruz.

Mas só agora, mais de 50 anos depois de ter imóvel próprio e passar por empréstimos e aluguéis de prédios, a Câmara vai estar num edifício próprio e sem confusões e suspeitas ao redor. A região do virtual Centro Cívico de Cascavel está sob uma tensa cobrança de precatórios, mas isso é outra história.

Um qüiproquó similar ao atual caso do cemitério ocorreu em março de 1969, primeiro ano da segunda gestão do prefeito Octacílio Mion. A lei 655/69 determinava que a Prefeitura iria comprar uma área para a construção do Batalhão da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros.

Foi nomeado um grupo de cidadãos para definir a área. O quartel da PM e o Corpo do Bombeiros ficariam localizados juntos, segundo o projeto da época. A comissão que iria fazer a escolha da área do quartel era, como de hábito, uma seleção de cidadãos de destaque na comunidade, incluindo representação da Câmara.

Prefeito agiu rápido

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No entanto, começaram a pipocar, como agora, suspeitas, denúncias veladas e insinuações de que a área a ser definida já estava de antemão acertada nos bastidores, o que levou um membro da comissão a se ausentar da reunião em que houve a definição. A essa altura parecia impossível conter a onda de suspeitas. O burburinho tomava conta da cidade em meio às mais estapafúrdias suposições.

A situação se agravava com o silêncio imposto pela ditadura, principalmente porque se tratava da pior fase do regime autoritário, sob a égide do famigerado AI-5. A imprensa louvava os governantes como se fossem deuses: “Vibra o Paraná inteiro com a chegada do Presidente Costa e Silva” (manchete do jornal Diário do Oeste, 23/3/1969).

O prefeito Octacílio Mion, um administrador experiente e de soluções rápidas, sequer tentou pôr panos quentes na coisa. Baixou imediatamente decreto anulando a aquisição da área sob o argumento de que não houve unanimidade por parte da comissão encarregada de fazer a escolha.

“Interpretações malévolas”

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No dia 19 de março de 1969, o prefeito Octacílio Mion baixou o decreto 016/69 acabando com a onda de boatos. Considerou “privilégio inaceitável concordar-se com, a aquisição da área destinada a Corpo de Bombeiros e do Batalhão da Polícia Militar do Estado, face não haver posição unânime da Comissão designada para este fim”. Assinalou que antes da reunião do grupo um dos membros havia comunicado que se ausentaria, propondo uma nova data para o encontro em que haveria a definição.

Assim, Mion considerou também que “a não participação do membro ausente propiciou interpretações malévolas quanto à legitimidade da proposta vencedora”. Por fim, considerando o interesse de preservar o Município quanto à lisura dos atos procedidos, optou por uma solução conciliatória, que foi revogar a concorrência pública realizada, determinando a expedição de um novo edital de concorrência e nomeando também uma nova comissão para julgar as propostas.

A nova comissão foi nomeada no dia seguinte – 20 de março – e ficou sob a presidência do vereador Horalino Bilibio (1926–1990), uma espécie de Jadir de Mattos da época, sempre atento a manobras que pudessem resultar em prejuízos ao Município. Na mesma data Mion assinou também o edital de concorrência pública para definir a área do Batalhão da PM.

Segundo o decreto, as propostas deveriam ser apresentadas em envelope lacrado às 14h do dia 4 de abril ao presidente da comissão, na presença dos demais membros, que estariam então reunidos para tomar a decisão final. O edital assinalava que o resultado da concorrência também poderia ser anulado, totalmente ou em parte.

Luta pela avenida Brasil

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Nessa época, a Prefeitura estava desapropriando e permutando terrenos quase que por “atacado”. Havia a necessidade de indenizar os proprietários dos imóveis do Patrimônio Velho, surgido em 1936, para determinar o recuo necessário à construção da atual avenida Brasil. Sem a demolição dessas casas antigas, boa parte do grande cartão-postal de Cascavel não poderia ter a atual pista dupla.

Houve muita confusão, pois havia proprietários se sentindo prejudicados em trocar terrenos valiosos na principal via pública da cidade terrenos mais afastados ou se recusavam, até ameaçando o uso da força, caso alguém quisesse despejá-los do local.

Com muito diálogo, diplomacia e também alguns arranca-rabos finalmente houve o cumprimento da lei e a comissão encarregada de fazer as avaliações foi justa tanto em relação ao interesse do Município quanto dos desapropriados.

O importante, hoje e sempre, é haver legislação adequada e regras claras para atos semelhantes, de modo que esse tipo de confusão não retarde desnecessariamente obras importantes e urgentes.

(Fonte: Alceu A. Sperança, jornal O Paraná, seção dominical Máquina do Tempo)