1A vós, Padre Baltasar,
vão os meus versos direitos,
porque são vossos defeitos
mais que as areias do mar:
e bem que estais num lugar
tão remoto, e tão profundo
com concubinato imundo,
como sois Padre Miranda,
o vosso pobre tresanda
pelas conteiras do mundo.
  
2Cá temos averiguado,
que os vossos concubinatos
são como um par de sapatos
um negro, outro apolvilhado:
de uma, e outra cor calçado
saís pela porta fora,
hora negra, e parda hora,
que um zote camaleão
toda a cor toma, senão
que a da vergonha o não cora.
  
3Vossa luxúria indiscreta
é tão pesada, e violenta,
que em dous putões se sustenta
uma Mulata, e uma Preta:
c’uma puta se aquieta
o membro mais desonesto,
porém o vosso indigesto,
há mister na ocasião
a negra para trovão,
e a parda para cabresto.
  
4Sem uma, e outra cadela
não se embarca o Polifemo,
porque a negra o leva a remo,
e a mulata o leva a vela:
ele vai por sentinela,
porque elas não dêem a bomba;
porém como qualquer zomba
do Padre, que maravilha,
que elas disponham da quilha,
e ele ao feder faça tromba.
  
5Elas sem mágoa, nem dor
lhe põem os cornos em pinha,
porque a puta, e a galinha,
têm o ofício de pôr:
ovos a franga pior,
cornos a puta mais casta,
e quando a negra se agasta,
e c’o Padre se disputa,
lhe diz, que antes quer ser puta,
que fazer com ele casta.
  
6A negrinha se pespega
c’um amigão de corona,
que sempre o Frisão se entona,
que ao maior amigo apega:
a mulatinha se esfrega
c’um mestiço requeimado
destes do pernil tostado,
que a cunha do mesmo pau
em obras de bacalhau
fecha como cadeado.
  
7Com toda esta cornualha
diz ele cego do amor,
que as negras tudo é primor,
e as brancas tudo canalha:
isto faz a erva, e palha,
de que o burro se sustenta,
que um destes não se contenta
salvo se lhe dão por capa
para a rua numa gualdrapa,
para a cama uma jumenta.
  
8Há bulhas mnito renhidas
em havendo algum ciúme,
porque ele sempre presume
de as ver sempre presumidas:
mas elas de mui queridas
vendo, que o Padre de borra
em fogo de amor se torra,
andam por negar-lhe a graça
elas com ele de massa,
se ele com elas à porra.
  
9Veio uma noite de fora,
e achando em seu vitupério
a mulata em adultério
tocou alarma por fora:
e por que pegou com mora
no raio do chumbo ardente,
foi-se o cão seguramente:
que como estava o coitado
tão leve, e descarregado
se pôde ir livremente.
  
10Porque é grande demandão
o senhor zote Miranda,
que tudo, o que vê demanda,
seja de quem for o chão:
por isso o Padre cabrão
de contino está a jurar
que os cães lhe hão de pagar,
e que as fodas, que tem dado,
lhas hão de dar de contado,
e ele as há de recadar.