Alvará de D. Maria I sobre a indústria no Brasil


EU A RAINHA, faço saber aos que este Alvará virem;

Que sendo-me presente o grande número de fábricas e manufaturas, que de alguns anos por esta parte se tem difundido em diferentes Capitanias do Brasil, com grave prejuízo da cultura, e da lavoura e da exploração das terras minerais daquele vasto continente; porque havendo nele uma grande, e conhecida, falta de população, é evidente, que quanto mais se multiplicar o número dos fabricantes, mais diminuirá o dos cultivadores, e menos braços haverá que se possam empregar no descobrimento, e rompimento de uma grande parte daqueles extensos domínios que ainda se acha inculta e desconhecida;

Nem as Sesmarias, que formão outra considerável parte desses mesmos domínios, poderão prosperar, nem florescer, por falta do beneficio da cultura, não obstante ser esta a essencialíssima condição, com que foram dadas aos proprietários delas;

E até nas mesmas terras minerais ficará cessando de todo, como já tem consideravelmente diminuído, a extração de ouro e diamantes, tudo procedido da falta de braços, que devendo empregar-se nestes úteis e vantajosos trabalhos, ao contrario os deixam e abandonam, ocupando-se em outros totalmente diferentes, como são os das referidas fábricas e manufaturas;

E consistindo a verdadeira e sólida riqueza nos frutos e produções da terra, os quais somente se conseguem por meio de colonos e cultivadores, e não de artistas e fabricantes;

E sendo além disto as produções do Brasil as que fazem todo fundo, e base, não só das permutações mercantis, mas da navegação e do comércio entre meus leais vassalos habitantes destes Reinos e daqueles domínios, que devo animar e sustentar em comum beneficio de uns e outros, removendo na sua origem os obstáculos que lhe são prejudiciais e nocivos;

Em consideração de tudo o referido;

Hei por bem ordenar que todas as fábricas, manufaturas ou teares de galões, de tecidos ou de bordados de ouro e prata;

De veludos, brilhantes, cetins, tafetás ou de outra qualquer qualidade de seda;

De belbutes, chitas, bombazinas, fustões ou de outra qualquer qualidade de fazenda de algodão ou de linho, branca ou de cores;

E de panos, baetas, droguetes, saetas, ou de outra qualquer qualidade de tecidos de lã; ou os ditos tecidos sejam fabricados de um só dos referidos gêneros, ou misturados, e tecidos uns com os outros; exceptuando tão somente aqueles ditos teares, e manufaturas, em que se tecem, ou manufaturam fazendas grossas de algodão, que servem para o uso, e vestuário dos negros, para enfardar, para empacotar fazendas, e para outros ministérios semelhantes; todas as mais sejam extintas e abolidas por qualquer parte em que se acharem em meus domínios do Brasil, debaixo de pena de perdimento, em tresdobro, do valor de cada uma das ditas manufaturas, ou teares, e das fazendas, que nelas, ou neles houver, e que se acharem existentes, dous meses depois da publicação deste; repartindo-se a dita condenação metade a favor do denunciante, se houver, e outra metade pelos oficiais, que fizerem a diligência; e não havendo denunciante, tudo pertencerá aos mesmos oficiais.

Pelo que, mando ao Presidente e Conselheiros do Conselho Ultramarino; Presidente do meu Real Erário; Vice-Rei do Estado do Brasil; Governadores e Oficiais Militares do mesmo Estado; Ministros das Relações do Rio de Janeiro e Bahia; Ouvidores, Provedores e outros Ministros, Oficiais de Justiça, e Fazenda, e mais Pessoas do referido Estado, cumpram, e guardem, e façam inteiramente cumprir, e guardar este meu Alvará como nele se contém, sem embargo de quaisquer Leis, ou disposições em contrário, as quais hei por derrogadas, para este efeito somente, ficando aliás sempre em seu vigor.

Dado no Palácio de Nossa senhora da Ajuda, em cinco de Janeiro de mil setecentos oitenta e cinco.

 
RAINHA
 

Martinho de Melo e Castro.


ALvará, por que Vossa Majestade é servida proibir no Estado do Brasil todas as fábricas, e manufacturas de ouro, prata, sedas, algodão, linho, e lã, ou os tecidos sejam fabricados de hum só dos referidos gêneros, ou da mistura de uns com os outros, excetuando tão somente as de fazenda grossa do dito algodão.

Para Vossa Majestade ver.

 

José Teotônio da Costa Posser o fez.

 

A. fol. 59 do Livro, em que se lançam os Alvarás nesta secretaria de Estado dos Negócios da Marinha, e Domínios Ultramarinos, fica este registrado. Sítio de Nossa Senhora da Ajuda em 2 de Março de 1785.

Francisco Delaage.

 

Na Oficina de Antônio Rodrigues Galhardo.