A FLOR DO EMBIROÇU
Noite, melhor que o dia, quem não te ama!
Fll. Elys.
Quando a nocturna sombra envolve a terra
E á paz convida o lavrador cançado,
Á fresca brisa o seio delicado
A branca flor do embiroçu descerra.
E das limpidas lagrymas que chora
A noite amiga, ella recolhe alguma;
A vida bebe na ligeira bruma,
Até que rompe no horisonte a aurora.
Então, á luz nascente, a flor modesta,
Qnando tudo o que vive alma recobra,
Languidamente as suas folhas dobra,
E busca o somno quando tudo é festa.
Suave imagem da alma que suspira
E odeia a turba vã! da alma que sente.
Agitar-se-lhe a aza impaciente
E a novos mundos transporlar-se aspira!
Tambem ella ama as horas silenciosas,
E quando a vida as lutas interrompe,
Ella da carne os duros elos rompe,
E entrega o seio ás illusões viçosas.
É tudo seu, — tempo, fortuna, espaço,
E o ceu azul e os seus milhões de estrêllas;
Abrazada de amor, palpita ao vel-as,
E a todas cinge no ideial abraço.
O rosto não encara indifferente,
Nem a traidora mão candida aperta;
Das mentiras da vida se liberta
E entra no mundo que jamais não mente.
Noite, melhor que o dia, quem não te ama?
Labor ingrato, agitação, fadiga,
Tudo faz esquecer tua aza amiga
Que a alma nos leva onde a ventura a chama.
Ama-te a flor que desabrocha á hora
Em que o último olhar o sol lhe estende,
Vive, embala-se, orvalha-se, recende,
E as folhas cerra quando rompe a aurora.