JOSÉ BONIFACIO[1]


De tantos olhos que o brilhante lume
Viram do sol amortecer no occaso,
Quantos verão nas orlas do horisonte
    Resplandecer a aurora?

Innumeras, no mar da eternidade,
As gerações humanas vão cahindo;
Sôbre ellas vae lançando o esquecimento
A pesada mortalha.


Da agitação esteril em que as tôrças
Consumiram da vida, raro apenas
Um echo chega aos seculos remotos,
     E o mesmo tempo o apaga.

Vivos transmitte a popular memoria
O genio creador e a sã virtude,
Os que o patrio torrão honrar souberam,
     E honrar a especie humana.

Vivo irás tu, egregio e nobre Andrada!
Tu, cujo nome, entre os que á patria deram
O baptismo da amada independencia,
     Perpetuamente fulge.

O engenho, as fôrças, o saber, a vida,
Tudo votaste á liberdade nossa,
Que a teus olhos nasceu, e que teus olhos
     Inconcussa deixaram.

Nunca interesse vil manchou teu nome,
Nem abjectas paixões; teu peito illustre
Na viva chamma ardeu que os homens leva
     Ao sacrifício honrado.


Se teus restos ha muito que repousam
No po commum das gerações extinctas,
A patria livre que legaste aos netos,
     E te venera e ama,

Nem a face mortal consente á morte
Que te roube, e no bronze redivivo
O austero vulto restitue aos olhos
     Das vindouras edades.

«Vede (lhes diz) o cidadão que teve
Larga parte no largo monumento
Da liberdade, a cujo seio os povos
     Do Brasil se acolheram.

«Póde o tempo varrer, um dia, ao longe,
A fabrica robusta; mas os nomes
Dos que o fundaram viverão eternos,
     E viverás, Andrada!»




  1.     Compuz estes versos por occasiào de ser inaugurada a es- tatua do patriarcha da Independencia, em 7 de Setembro de 1873.
        Pediu-m os o Sr.Commendador J. Norberto de S. S., illustrado vice-presidente do Instituto Historico e membro da commissão qua promovera aquelle monumento. Não podia haver mais agradavel tarefa do que esta de prestar homenagem ao honrado cidadão, cuja nome a historia conserva ligado ao do Fundador do Império.