1Amigo Senhor José,
não me fareis uma obra;
porque se a graça vos sobra,
me fazeis graça, e mercê:
fazei-me uma obra, em que
honra me deis aos almudes,
e se em vossos alaúdes,
que Apolo vos temperou,
não cabe o pouco, que eu sou,
caberão vossas virtudes.
  
2Fazei-me uma obra, enquanto
a Musa se me melhora,
que eu prometo desde agora
pagar-vos tanto por tanto:
que como Deus é bom Santo,
e não há ovo sem gema,
sereis do meu plectro o tema,
porque, a quem me faz um verso,
não serei eu tão perverso,
que lhe não faça um poema.
  
3Saiam esses resplandores
essas luzes rutilantes,
rubis, pérolas, diamantes,
cravos, açucenas, flores:
saiam da Musa os primores,
que há hortelão da poesia,
que gasta em menos de um dia
de flores um milenário,
e há Poeta Lapidário
gastador da pedraria.
  
4Eu quatro versos fazendo
não me meto em gasto tal,
nem posso chamar cristal,
a mão, que humana estou vendo:
aos olhos, que ao que eu entendo,
são de sangue dous pedaços,
não chamo diamantes baços,
porque os não tenho por tais,
que há Poetas Liberais,
e os meus são versos escassos.
  
5Vós sois o Deus da poesia,
que sobre o vosso Pegaso
andais mudando o Parnaso
neste monte da Bahia:
nos ensina aos praticantes
tão graciosos consoantes,
que vos juro a Jesu Cristo,
que em quantos versos hei visto,
não vi versos semelhantes.
  
6Sois Poeta natural,
e tendes sempre a mão cheia
não só na Aganipe a veia,
mas na veia um mineral:
correm por um manancial
da vossa boca Aretusas,
e as nove Musas obtusas
de ver o vosso partolo,
em vez de Musas de Apolo,
querem ser as vossas Musas.