1Antes de ser fabricada
do mundo a máquina digna,
já lá na mente divina,
Senhora, estáveis formada:
com que sendo vós criada
então, e depois nascida
(como é cousa bem sabida)
não podíeis, (se esta sois)
na culpa, que foi depois,
nascer, Virgem, comprendida
2Entre os nascidos só vós
por privilégio na vida
fostes, Senhora, nascida
isenta da culpa atroz:
mas se Deus (sabemos nós)
que pode tudo, o que quer,
e vos chegou a eleger
para Mãe sua tão alta,
impureza, mancha, ou falta
nunca em vós podia haver.
3Louvem-vos os serafins,
que nessa Glória vos vêem,
e todo o mundo também
por todos os fins dos fins:
Potestades, querubins,
e enfim toda a criatura,
que em louvar-vos mais se apura,
confessem, como é razão,
que foi vossa conceição
sacra, rara, limpa, e pura.
4O Céu para coroar-vos
estrelas vos oferece,
o sol de luzes vos tece
a gala, com que trajar-vos:
a lua para calçar-vos
dedica o seu arrebol,
e consagra o seu farol,
porque veja o mundo todo,
que brilham mais deste modo
Céu, estrelas, lua, e sol.