1Apareceram tão belas
no mar canoas, e truzes,
que se o céu é mar de luzes,
o mar era um céu de estrelas:
era uma armada sem velas
movida de outro elemento,
era um prodígio, um portento
ver com tanto desafogo
esta navegar com fogo,
se outras arribam com vento.
  
2Sua Ilustríssima estava
assustado sobre absorto,
porque via um rio morto
o fogo, em que se abrasava:
grande cuidado Ihe dava ver,
que o mar morria então
infamado na opinião,
e como um judeu queimado,
sendo, que o mar é sagrado,
que inda é mais que ser cristão.
  
3Lá no vale ardia o ar,
e por ser, comua a guerra,
no mar há fogo de terra,
na terra há fogo do mar:
toda a esfera a retumbar
fazia correspondência,
e com alegre aparênca
luzia na ardente empresa
fogo do ar por alteza,
e do mar por excelência.
  
4Em cima as rodas paravam,
que varia a fortuna toda
desandava a sua roda,
e as do fogo não paravam:
os mestres se envergonhavam,
que era Lourenço, e Diogo:
e eu vi, que a Lourenço logo
a face se quebrantava,
com que a mim mais me queimava
o seu rosto, que o seu fogo.
  
5Deu-se fogo em conclusão
a uma roda de encomenda,
foi como a minha fazenda,
que ardeu num abrir de mão:
estava em meio do chão
um rasto, para que ardesse
uma câmara, e parece,
que uma faísca caiu,
disparou: quem jamais viu,
que o fogo em câmeras desse.
  
6Era grande a multidão
do Clero, e dos Seculares,
que a graça destes folgares
consiste na confusão:
Sua llustríssima então
se foi, que o fogo não zomba,
aqui queima, ali arromba:
segue-lhe o vigário os trilhos,
que as rodas não tinham filhos
mas pariam muita bomba.
  
7A gente ficou pasmada,
porque viu a gente toda,
que era a resposta da roda
de bombarda respostada:
ficou a turba enganada,
porque enfim nos perturbarnos:
mas todos nos alegramos,
que isto somos, e isso fomos,
que então alegres nos pomos
quando mais nos enganamos.
  
8Entre o desar, e entre o risco
a noite alegre passou:
que mais noite! se a gabou
té o Padre São Francisco:
nas mais paróquias foi cisco,
foi sombra, foi ar, foi nada
do nosso Prelado a entrada,
e a desconfiança é vã
de o Cura ter bolsa chã,
se a vontade é tão sobrada.