Personagens: OS MESMOS e MANUEL PRAXEDES

PRAXEDES (Entrando e ouvindo a discussão.) — Então o que é isto? estão brigando? Discussões científicas!... Bravo! muito bem.

LUÍSA — Pomada! O senhor era o menos competente para atirar-me ao rosto semelhante nome. A minha clínica...

DR. PEREIRA — A sua clínica desaparecerá, minha senhora, no dia em que as mulheres formarem-se às dúzias e aos centos.

PRAXEDES — E este dia não está longe. Em todo caso, cabe à minha doutora a glória...

MARIA (Baixo a Praxedes.) — Pois em vez de acalmar, estás a fomentar discussões!

PRAXEDES — Deixa, mulher, isto é muito bonito!

LUÍSA — No dia em que as mulheres formarem-se aos centos, a medicina terá tocado o zênite da sua glória; porque só assim entrarão nela as aptidões científicas que até aqui os senhores, egoisti­camente, nos têm negado, e os sentimentos de caridade que são o mais belo apanágio do nosso sexo.

PRAXEDES — Muito bem!

DR. PEREIRA — Sinto não ter vontade de rir; porque o que acaba de dizer só pode ser respondido com uma gargalhada, Senhora Doutora Luísa Praxedes... Note que eu digo Doutora Luísa Praxedes, e não Doutora Luísa Pereira.

LUÍSA — O grau que recebi foi de Doutor e não de Doutora! A Faculdade de Medicina não conhece Doutoras. Uma vez que toca neste ponto, fique sabendo que vou mandar tirar a placa que está lá embaixo, e declarar pelos jornais que doravante assinar-me-ei Doutor Luísa Praxedes porque foi este o nome com que me formei.

PRAXEDES (Para Maria.) — Sim, senhora! Lá isto é verdade!

DR. PEREIRA — Pois bem, Senhora Doutora ou Doutor Luísa Praxedes, como queira, eu não estou disposto a representar por mais tempo o papel ridículo de marido de parteira, de professora pública ou de cantora lírica. Sou cabeça do casal. Tenho a minha posição definida em Direito perante a família e perante a sociedade. Ou a senhora muda de rumo ou...

LUÍSA — Acabe o dilema.

DR. PEREIRA — Ou eu dou-lhe uma lição que lhe há de ser fatal. (Sai.)