Meu caro Bruno Lôbo:

Lembra-te Bruno que sou teu velho conhecido de há muitos anos. Conheci-te ainda estudante quando não tinhas tido a honra e glória de escrever a famosa brochura sobre a A Estrutura do Cilindro-Eixo. Como tu tinhas fartas relações com jornalistas e aderentes, a tua brochura tão especial teve grande repercussão, graças à "reclame" que aqueles te fizeram. Tudo fazia que te encaminhasses por esse campo de Histologia e coisas parecidas. Tal, porém, não se deu. Tu, Bruno, achastes que esse campo era estreito demais para os teus méritos intelectuais. Quiseste mais. Era justo, porquanto tu és inteligente.

Eu mesmo tive ocasião de verificar isso, quando passei em tua companhia cerca de oito dias no Júri, naquele famoso Júri em que tu foste presidente e eu fui perseguido por causa dele e tu homenageado.

Dizia, porém, que tudo fazia crer que tu continuasses pelo campo da Histologia. Não o quiseste; e, num belo dia, li que tu eras nomeado Diretor do Museu Nacional. Assombrei-me. Bruno sabichão em História Natural, em arqueologia egípcia, em antiguidades americanas! Quem o diria! Enfim... O mundo dá muitas voltas e tem muitas surpresas.

Não ficaram aí as que me reservaram o meu amigo Bruno, que não é uma caixa delas, mas um caixão.

Feito diretor do Museu, tu, meu caro Bruno, arvorando-te em Congresso Nacional, emancipaste a mulher e nomeaste a inefável Berta Lutz secretário do referido Museu.

Não chegava. O sábio histologista precisava mostrar que era capaz de maiores espantos. Que pensou? Fez-se sabichão em Belas-Artes. É verdade que, quando estiveste em Paris, freqüentaste Helios Seilinger, Lucílio e outros, e nessa Academia adquiristes profundos conhecimentos de artes plásticas.

Confiante neles, em breve trataste de pontificar sobre elas, sem ler Winckelmann, Michel, Taine, Hegel e mesmo Morales de los Rios.

Pleiteaste, cabalaste e acabaste te fazendo presidente da Sociedade de Belas-Artes.

Está aí como o meu amigo Bruno Lobo de "olhador" de microscópio passou a ser crítico de arte e pontífice em pintura, escultura, gravura, arquitetura, etc., etc.

Dou-te parabéns, Bruno, porque vens revelar que o Brasil possui um Pico de Mirandola ou um Leonardo da Vinci.

Ainda bem!

Careta, 17-6-1922.