XXI


Murmurações


Faça o marido de quando em quando uma estação a sua mulher ; admoeste-a, que nem no seu estrado, nem em o alheio apóde ninguém ; cousa muito certa, e de que as apodadas, sendo mulheres, se cansam assaz, e também apódam ; e de que, se homens, logo lançam mão para queixas, ou agradecimentos. Que não desenrole os cuidados alheios, se fulano olha, ou se passeia a fulana. Parece cousa imprópria, que uma senhora, que não é bem que saiba mais que de si, e sua casa, traga registados os pensamentos do outro. Nunca a algum homem dos do lugar em que viver, louve, ou injurie. É nas mulheres êste diverso efeito (de ordinário) procedido de uma própria causa. Daqueles de quem muito mal se diz, e daqueles de quem muito bem se conta, julguei sempre um igual mistério ; e foi o pior que nunca me enganei nestas sentenças. Deve ser a prática das mulheres, do seu lenço de amostras, do ruim tempo que vai para curar pastilhas, queixar-se das criadas, e ainda para que se queixem dos despegos de seus maridos, lhes dou licença ; ainda que lhes levantem falso testemunho.

E porque sei que hão-de pedir maior comarca para sua conversação, me parece que lhes podemos conceder, que possam até estranhar o bem, ou mal feito vestido que traz D. Fulana : e quando muito, chegar a não lhe parecer bem as côres, de que o betou, contanto que lhas não interpretem.