CACHIAS.
1 de Agosto.
Cachias, bella flôr, lyrio dos valles,
Gentil senhora de mimosos campos,
Como por tantos annos foste escrava,
Como a indocil cerviz curvaste ao jugo?
Ohl como longos annos insoffriveis,
Rainha altiva, destoucada e bella,
Rojaste aos pés de um regulo soberbo?
Á mingoa definhaste em negro carcer,
Onde um raio de sol não penetrava;
Em masmorra cruel, donde não vias
Scintillar o clarão d’amiga estrella...
Oh! não, que a luz da esp’rança tinhas n’alma,
E o sol da liberdade um dia viste,
De gloria e de fulgor resplandecente,
Em céo sem nuvens no horisonte erguido.
Eis o som do tambor atroa os valles,
O clangor da trombeta, os sons das armas,
A terra abalão, despertando os échos.
— Eia! oh bravos, erguci-vos, — á peleja,
Á fome, á sêde, ás privações, — erguei-vos!
Tu, Cachias, acorda, — tu, rainha,
Lamina d’aço puro, envolta em ferro,
Ao sol refulgirás; — flôr que esmoreces,
Á mingoa d’ar, cm carcere de vidro,
Em ar mais livre cobrarás alento,
Graça, vida e frescor da liberdade.
Antemural do lusitano arrojo,
Ultimo abrigo seu, — feros soldados,
Veteranas cohortes nos teus montes
Cavão bellicas tendas! — Um guerreiro,
O nobre Fidié, que a antiga espada
Do valor portuguez empunha hardido,
No seu mando as retem: debalde, oli forte,
Expões teus dias! teu esforço inutil
Não susta o sol no rapido declive,
Que imerge áquem dos Andes orgulhosos.
D’Africa e d’Asia os desbotados louros!
Eia! — o bronzeo canhão rouqueja, estoura,
Ribomba o ferreo som d’um écho em outro,
Nuvens de fumo e pó lá se condensão...
Correi, bravos, correi!... mas tu és livre,
És livre como o arbusto dos teus prados,
Livre como o condor que aos céos se arroja;
És livre! — mas na accesa phantasia
Debuxava-me o espirito exaltado
Fragoas cruas de morte, o horror da guerra
Descobrir, contemplar. — Oh! fôra bello
Arriscar a existencia em pró da patria,
Regar de rubro sangue o patrio solo,
E sangue e vida abandonar por ella.
Longe, delirios vãos, longe phantasmas
De ardor febricitante!
Á gloria deste dia comparar-se
Póde acaso visão, delirio, ou sonlio?
Ao fausto anniversario
Da nossa independencia?
Acclamações altisonas
Corrão nos ares da immortal Cachias:
Seja padrão de gloria entre nós outros
Sanctificada aurora,
Que os vis grilhões de escravos vio partidos.