Era uma vez um rei e não tinha filhos e tinha muita paixão por isso e a mulher disse que Deus lhe desse um filho antes que fosse um sapo. Houve de ter um filhinho como um sapo; depois botaram ás folhas a ver se havia quem o queria crear, mas ninguem se animava a vir. O rei vendo que o sapito do filho não havia quem o queria crear annunciou que se houvesse alguma mulher que o quizesse crear lh’o dava em casamento e lhe dava o reino. N’isto ahi appareceu uma rapariga e disse: «Se vossa real magestade me dá o filho, eu animo-me a vil-o crear.» O rei disse que sim e a rapariga veiu crear o sapito. Depois passou algum tempo e elle foi crescendo e ella lavava-o e esmenava-o como se elle fosse uma creança. Foi indon e elle tinha uns olhos muito bonitos e fallava, e a rapariga dizia: «Os olhos d’elle e a falla não são de sapo.» Já estava grande, passaram-se anos e ella uma noite teve um sonho em que lhe diziam ao ouvido que o sapo era gente, mas pela grande heresia que a mãe disse que estava formado em sapo, que se o rei lh’o désse para ella casar com elle que casasse e quando fosse na primeira noite que se fosse deitar, que elle tinha sete pelles e ella levasse sete saias e quando elle lhe dissesse tira uma saia, lhe dissesse ella: tira uma pelle. Assim foi e casou o sapo com a rapariga e na noite do casamento elle pediu-lhe que tirasse ella as saias e ella foi-lhe pedindo que tirasse elle as pelles e depois d’elle as tirar ficou um homem. Ao outro dia elle tornou a vestir as pelles e ficou outra vez sapo. E ella disse-lhe: «Tu para que vestes as pelles? Assim és tão bonito e vaes ficar sapo.» — «Assim me é preciso, cala-te.» Ella assim que se poz a pé foi contar tudo á rainha, e o rei mais a rainha disseram-lhe: «Quando hoje te deitares, diz-lhe o mesmo e depois d’elle tirar as pelles e estar a dormir, deixa a porta do quarto aberta que nós queremol-o ir ver.» Foram-no ver e viram que elle era homem. Ao outro dia o principe tornou a vestir as pelles e vae o pae ao outro dia disse-lhe: «Tu, porque vestes as pelles e queres ser feio?» — «Eu quero ser sapo, porque o meu pae tem mão interior e se eu fico bonito impõem a minha mulher.» O rei disse-lhe: «Eu não a impunha, mas queria que tu ficasses bonito.» Depois como viram que elle não queria deixar de ser sapo, pediram a ella que assim que elle adormecesse lhes trouxesse as pelles para elles as queimarem. Ella assim fez, e elles botaram as pelles ao fogo aceso. De manhã vae elle para vestir as pelles e não as acha. «Que é das pelles?» «Veiu aqui teu pae e tua mãe, e levaram-nas.» «Mal hajas tu se lh’as déstes, mais quem te deu o conselho. Adeus; se alguma vez me tornares a ver dá-me um beijo na bocca.»
A mulherzinha ficou; mas o rei e a mulher assim que viram que o filho faltou puzeram-na fóra da porta. Ella, coitada, não tinha com que se tractar; o que era do rei lá ficou e ella estava muito pobresinha. A todas as pessoas que via perguntava se tinham visto um homem assim e assim e lá lhe dava as noticias do principe. Vieram por onde ella estava uns cegos e ella fez-lhes a pergunta. Os moços dos cegos disseram-lhe: «Nós vimos no rio Jordão um homem e certamente era elle; estava botando fatias de pão para traz das costas e dizendo: pela alma de meu pae, pela alma de minha mãe: pela alma de minha mulher.» Ella disse-lhe a elles «Vocês quando tornam para essa banda?» «Nós para o fim do outro mez voltamos para lá; havemos de passar por esse rio.»
A mulherzinha apromptou-se e foi com elles. Chegou lá e era o principe. Ella chegou ao pé d’elle e deu-lhe o beijo na bocca como elle tinha dito e disse-lhe: «Ora vamos embora, que se acabou o nosso fado.» E foram para casa e foram muito felizes e tiveram muitos filhos.
(Ourilhe.)