1Da tua Perada mica
não te espantes, que me enoje,
porque é força, que a entoje
sendo doce de botica:
o gosto não se me aplica
a uma conserva afamada,
e em botes tão redomada,
que sempre por ter que almoces,
achas para tão maus doces
a tutia preparada.
2Se tua Tia arganaz
te fez essa alcomonia,
com colher não ta faria,
com espátula ta faz:
criaste-te de rapaz
co pingue dessas redomas,
e hoje tal asco lhe tomas,
que tendo uma herança rica
hás raízes da botica,
contudo não tens, que comas.
3Teu juízo é tão confuso,
que quando a qualquer cristão
lhe entra o uso de rezão,
de então lhe perdeste o uso:
sempre foste tão obtuso,
que já desde estudantete
te tinham por um doudete,
porque eras visto por alto,
na fala falso contralto,
na vista fino falsete.
4Correndo os anos cresceste,
e se dizia em sussurro,
que era o teu crescer de burro,
pois cresceste, e aborreceste:
logo em tudo te meteste,
querendo ser eminente
nas artes, que estuda a gente,
mas deixou-te a tua asnia
Abel na filosofia,
na poesia inocente.
5Deram-te as primeiras linhas
versos de tão baixa esfera,
que o seu menor erro era
serem feitos às Negrinhas:
com estas mesmas pretinhas,
por mais que te desbatizes,
gastaste os bens infelizes
do Marquês fino herbolário,
porque todo o Boticário
é mui rico de raízes.
6Sendo um zote tão supino,
és tão confiado alvar,
que andas por i a pregar
geringonças ao divino:
pregas como um capuchino,
porque essa traça madura
um curado te assegura,
crendo Sua Senhoria,
que a botica te daria
as virtudes pare a cura.
7Mas ele se acha enganado,
porque vê evidentemente,
que os botes para um doente
são, mas não pare um curado:
entraste tao esfaimado
a comer do sacrifício,
que todo o futuro ofício
cantaste sobre fiado,
pelo tirar de contado
ao dono do benefício.
8Nenhuma outra cousa é
este andar dos teus alparques,
mais que ser Filho de Marques
vizinho da Santa Sé:
outro da mesma ralé
tão Marques, e tão bribante
te serve agora de Atlante,
porque para conjurer-se,
é facil de congregar-se
um com outro semelhante.