- Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
- Serviram-me o amor como dobrada fria.
- Disse delicadamente ao missionário da cozinha
- Que a preferia quente,
- Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.
- Impacientaram-se comigo.
- Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
- Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
- E vim passear para toda a rua.
- Quem sabe o que isto quer dizer?
- Eu não sei, e foi comigo ...
- (Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
- Particular ou público, ou do vizinho.
- Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
- E que a tristeza é de hoje).
- Sei isso muitas vezes,
- Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
- Dobrada à moda do Porto fria?
- Não é prato que se possa comer frio,
- Mas trouxeram-mo frio.
- Não me queixei, mas estava frio,
- Nunca se pode comer frio, mas veio frio.