Infelizmente, retardada de um dia pela circunstância de haver sido comunicada para fora da capital pelo serviço da folha ao seu redator-chefe, temos o prazer de dar hoje a lume, com as honras que se lhe devem, a carta, com que nos honrou o Dr. Joaquim Nabuco.
Ainda bem que o seu nobre espírito fez justiça ao autor destas linhas em não descobrir em nosso editorial de trasantontem outros sentimentos além dos que lhe transluzem à superfície, sem malícias, reticências, nem entrelinhas. Dirigindo-se, na sua resposta, ao antigo companheiro das suas primeiras lidas intelectuais, evocando as reminiscências da confraternidade, que já então nos unia nas mesmas aspirações liberais, na mesma vocação da imprensa, no mesmo amor das letras, com a diferença apenas entre nós, da sua superioridade indiscutível, não lhe enganou o instinto do seu coração. É ainda a mesma aspiração daquela época, a mesma cordialidade, o mesmo interesse pelo futuro de um nome, em cujos primeiros triunfos os seus condiscípulos já adivinhavam grandes horizontes de glória, vastas perspectivas de luminosa celebridade.
Certo que não podíamos escolher acontecimento de conseqüências tão consideráveis, quer para o seu protagonista, quer para a política da atualidade, dar o nosso juízo em relação a um sucesso de faces tão complexas, com uma apreciação inteiriça na aquiescência, ou na censura, no júbilo, ou nos receios. Tampouco nos era possível saudar o advento de um homem como o Dr. Joaquim Nabuco, do seu valor, da sua expressão, da sua força, a uma situação nova, e inesperada como esta, com um simples hino de epítetos louvaminheiros, com uma glorificação de adjetivos.
No ponto de vista que a Imprensa tem ocupado entre os seus ilustres colegas, buscando pregar sempre aos republicanos a tolerância, aos monarquistas a transação, evitando constantemente os extremos, e incorrendo, por isso, tanta vez, na animadversão dos irreconciliáveis, tínhamos a inevitável obrigação e a necessidade impreterível de projetar sobre todos os aspectos desse fato a luz da reflexão desinteressada e imparcial.
Se ele fosse nos arraiais do antigo regímen o sinal de um movimento de aproximação para o novo, seria o caso de felicitarmo-nos, vendo realizar-se, enfim, a evolução advogada por nós, desde 1893, nas colunas do Jornal do Brasil, quando, em uma série de artigos editados por essa preocupação, escrevemos dali o nosso manifesto aos conservadores.
Se, pelo contrário, as fileiras monarquistas se retraíssem, e recuassem diante “do ponto de honra”, onde não se deixam as convicções, indo servir à pátria nos seus reclamos superiores, seria, entre os melhores amigos do país, ocasião de grave tristeza pela esterilidade política de sacrifício tamanho.
Em todo o caso ninguém estava em condições de avaliar melhor que o autor destas linhas, cujo espírito já viu diante de si esse cálice*, mas sem a coragem de prová-lo, que Deus felizmente liberalizou ao nosso eminente amigo, reunindo-lhe o vigor d’alma à mais alta capacidade. É uma circunstância que, a bem da verdade histórica, e em defesa contra a incansável malignidade, somos obrigados, e com o maior constrangimento, a mencionar. Quando ao autor destas linhas ofereceu a missão concernente à pendência com a França, de cuja honra ele julgou dever declinar, o Dr. Manuel Vitorino, instando pela sua anuência, declarou-lhe que essa missão, se o convidado a aceitasse, se estenderia também, depois, à questão de limites com a Guiana Holandesa e com a Guiana Inglesa. A consciência de sua fraqueza não lhe permitiu arrostar a imensidade dos perigos da tarefa.
Se em nossa linguagem, pois, divisar alguém traços, que não sejam de pura exaltação pelo ato patriótico do Sr. Joaquim Nabuco, nada os terá inspirado, senão o zelo por uma reputação, que é hoje uma das poucas fortunas de nossa vida política, por uma força, em que, aos olhos dos seus condiscípulos, dos seus amigos, dos seus conterrâneos, sempre se enxergou uma das reservas preciosas do nosso porvir.
Façamos votos à Providência, para que ela o laureie vencedor.