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==A História da velha==
 
"Nem sempre tive os olhos turvos e as pálpebras vermelhas, nem meu nariz sempre tocou meu queixo... Nem sempre fui uma serva. Sou a filha do Papa Urbano X <ref>A seguinte nota póstuma foi adicionada na edição M. Beuchot às obras de Voltaire emitidas em 1829:<br>''Veja a extrema discrição do autor, até o presente momento nunca houve um Papa Urbano X, ele temia atribuir um bastardo a um Papa conhecido. Que circunspecção! Que delicadeza de consciência!''<br>O último Papa Urbano foi o oitavo que morreu em 1644.</ref> com a princesa de [[w:Palestrina|Palestrina]]. Até a idade de catorze anos, fui criada em um palácio, para qual todos os castelos de seus barões alemães dificilmente sequer teriam servido de estábulos, uma das minhas vestes valia mais do que toda a magnificência de Westphalia. Crescia em beleza, graça, talento, em meio a prazeres, respeito e expectativas. Eu inspirava amor. Meu colo era formoso, que colo! bBrancoBranco, firme, igual a da [[w:Vênus de Medici|Vênus de Medici]], e meus olhos! Que olhos! As sobrancelhas negras! Haviam chamas brilhantes em meus olhos que eclipsavam a cintilação das estrelas! Como diziam os poetas do bairro. As criadas que me vestiam caiam em êxtase ao me verem despida e todos os homens queriam ser elas."
 
"Eu estava prometida ao príncipe mais excelente de [[w:Massa-Carara|Massa-Carara]]. Tal príncipe! Tão bonito como eu, doce, agradável, brilhantemente espirituoso e radiante de amor. Eu o amava como se quando se ama pela primeira vez - com idolatria,. As núpcias foram preparadas, pompa e magnificência surpreendentes; houve festas, carrosséis,uma contínua ''opera bouffe''<ref>''Opera bouffe'' é um gênero de ópera do final do século IXX.</ref>, todos os sonetos da Itália compostos em meu louvor, embora nenhum deles estivessem aceitáveis, eu estava prestes a alcançar o cume da felicidade, quando uma marquesa de idade, que tinha sido amante do príncipe, meu marido, convidou-o a beber chocolate com ela. Ele morreu em menos de duas horas sofrendo terríveis convulsões. Mas isto é o de menos. Minha mãe, em desespero e não menos aflita do que eu, determinou que nós devêssemos nos ausentar por algum tempo de tão fatal lugar. Ela tinha uma propriedade muito bonita aos redores de Gaeta. Nós embarcamos a bordo de uma galera do nosso país, que era dourada e grande como o altar de São Pedro, em Roma. Um corsário de Sallee nos abordou nossos homens defenderam-se como se fossem os soldados do Papa; lançaram-se sobre seus joelhos atirando os braços, implorando ao corsário uma absolvição ''in articulo mortis''<ref>''In articulo mortis'' do latim, significa ''na hora da morte'', é uma expressão muito usada em Teologia e Direito para definir ações ou decisões para o caso de morte eminente.</ref>.
 
"Imediatamente eles foram despidos como macacos, e não foi diferente com minha mãe, nossas damas de honra e comigo. É impressionante a rapidez com que sabem despir uma pessoa... Mas o que mais me surpreendeu foi que enfiaram seus dedos em partes de nossos corpos, que em mulheres geralmente se introduzem cânulas. Aquilo pareceu-me um tipo muito estranho de cerimônia, mas é como julgamos as coisas de que desconhecemos, aprendi depois que era para tentar saber se estávamos escondendo diamantes. Esta é a prática estabelecida desde tempos imemoriais, entre nações civilizadas que percorrem os mares. Fui informada de que nunca os Cavaleiros de Malta, muito religiosas, fazem esse tipo de vistoria quando tomam qualquer Turco como prisioneiro, seja de qual for o sexo. Uma lei das nações da qual eles nunca se afastam."
 
"Não preciso dizer a vós o grande sofrimento que foi para uma jovem princesa e sua mãe se tornarem escrava e serem levadas para o Marrocos. Podem facilmente imaginar tudo o que se pode sofre a bordo de um navio pirata. Minha mãe ainda era muito bonita, nossas damas de honra e até as nossas serviçais tinham mais encantos do que se encontram em toda a África. Quanto a mim, estava deslumbrante, belíssima, a graça em pessoa, e eu era virgem! O que não permaneci assim por muito tempo! Esta flor, que tinha sido reservada para o belo Príncipe de Massa-Carara, foi arrancada pelo capitão corsário. Um negro abominável que ainda acreditava ter me feito grande honra. Certamente a princesa de Palestrina e eu devíamos ter sido muito forte para passar por tudo o que vivemos até nossa chegada em Marrocos! Mas deixemos isso, estas são coisas tão comuns, não dignas de nota."
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Je fus fiancée à un prince souverain de Massa-Carrara : quel prince ! aussi beau que moi, pétri de douceur et d’agréments, brillant d’esprit et brûlant d’amour ; je l’aimais comme on aime pour la première fois, avec idolâtrie, avec emportement. Les noces furent préparées : c’était une pompe, une magnificence inouïe ; c’étaient des fêtes, des carrousels, des opéra-buffa continuels ; et toute l’Italie fit pour moi des sonnets dont il n’y eut pas un seul de passable. Je touchais au moment de mon bonheur, quand une vieille marquise, qui avait été maîtresse de mon prince, l’invita à prendre du chocolat chez elle ; il mourut en moins de deux heures avec des convulsions épouvantables ; mais ce n’est qu’une bagatelle. Ma mère au désespoir, et bien moins affligée que moi, voulut s’arracher pour quelque temps à un séjour si funeste. Elle avait une très belle terre auprès de Gaïète : nous nous embarquâmes sur une galère du pays, dorée comme l’autel de Saint-Pierre de Rome. Voilà qu’un corsaire de Salé fond sur nous et nous aborde : nos soldats se défendirent comme des soldats du pape ; ils se mirent tous à genoux en jetant leurs armes, et en demandant au corsaire une absolution _in articulo mortis_.
Aussitôt on les dépouilla nus comme des singes, et ma mère aussi, nos filles d’honneur aussi, et moi aussi. C’est une chose admirable que la diligence avec laquelle ces messieurs déshabillent le monde ; mais ce qui me surprit davantage, c’est qu’ils nous mirent à tous le doigt dans un endroit où nous autres femmes nous ne nous laissons mettre d’ordinaire que des canules. Cette cérémonie me paraissait bien étrange : voilà comme on juge de tout quand on n’est pas sorti de son pays. J’appris bientôt que c’était pour voir si nous n’avions pas caché là quelques diamants ; c’est un usage établi de temps immémorial parmi les nations policées qui courent sur mer. J’ai su que messieurs les religieux chevaliers de Malte n’y manquent jamais quand ils prennent des Turcs et des Turques ; c’est une loi du droit des gens à laquelle on n’a jamais dérogé.
Je ne vous dirai point combien il est dur pour une jeune princesse d’être menée esclave à Maroc avec sa mère : vous concevez assez tout ce que nous eûmes à souffrir dans le vaisseau corsaire. Ma mère était encore très belle : nos filles d’honneur, nos simples femmes de chambre avaient plus de charmes qu’on n’en peut trouver dans toute l’Afrique : pour moi, j’étais ravissante, j’étais la beauté, la grâce même, et j’étais pucelle : je ne le fus pas long-temps ; cette fleur, qui avait été réservée pour le beau prince de Massa-Carrara, me fut ravie par le capitaine corsaire ; c’était un nègre abominable, qui croyait encore me faire beaucoup d’honneur. Certes il fallait que madame la princesse de Palestrine et moi fussions bien fortes pour résister à tout ce que nous éprouvâmes jusqu’à notre arrivée à Maroc ! Mais passons ; ce sont des choses si communes, qu’elles ne valent pas la peine qu’on en parle.
Maroc nageait dans le sang quand nous arrivâmes. Cinquante fils de l’empereur Muley Ismael[1] avaient chacun leur parti ; ce qui produisait en effet cinquante guerres civiles, de noirs contre noirs, de noirs contre basanés, de basanés contre basanés, de mulâtres contre mulâtres : c’était un carnage continuel dans toute l’étendue de l’empire.
[1] Sur Muley Ismael, qui régnait en 1702, et vécut cent cinq