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É uma história curiosa a que lhe vou contar, minha prima. Mas é uma história, e não um romance.
 
Há mais de dois anos, seriam seis horas da tarde, dirigi-me ao Rocio para tomar o ônibus de Andaraí.
 
Sabe que sou o homem o menos pontual que há neste mundo; entre os meus imensos defeitos e as minhas poucas qualidades, não conto a pontualidade,
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essa virtude dos reis, e esse mau costume dos ingleses.
 
Entusiasta da liberdade, não posso admitir de modo algum que um homem se escravize ao seu relógio e regule as suas ações pelo movimento de uma pequena agulha de aço ou pelas oscilações de uma pêndula.
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Fazia uma noite de inverno fresca e úmida; o céu estava calmo, mas sem estrelas.
 
À hora marcada chegou o ônibus, e apressei-me a ir tomar o meu lugar. Procurei, como costumo, o fundo do carro, a fim de ficar livre das conversas monótonas dos recebedoresreceb
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edores, que de ordinário têm sempre uma anedota insípida a contar, ou uma queixa a fazer sobre o mau estado dos caminhos.
 
O canto já estava ocupado por um monte de sedas, que deixou escapar-se um ligeiro farfalhar, conchegando-se para dar-me lugar.
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Resignei-me, e assentei que o melhor era cuidar de outra coisa.
 
Já o meu pensamento tinha-se lançado a galope pelo mundo da fantasia, quando de repente fui obrigado a voltar
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por uma circunstância bem simples.
 
Senti no meu braço o contato suave de um outro braço, que me parecia macio e aveludado como uma folha de rosa.
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Assim, fascinado ao mesmo tempo pela minha ilusão e por este contato voluptuoso, esqueci-me, a ponto que, sem saber o que fazia, inclinei a cabeça e colei os meus lábios ardentes nesse ombro, que estremecia de emoção.
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Ela soltou um grito, que foi tomado naturalmente como susto causado pelos solavancos do ônibus, e refugiou-se no canto.
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Mas senti outra vez a sua mãozinha, que apertava docemente a minha, como para impedir-me de sair.
 
Está entendido que não resisti, e que me deixei ficar; ela conservava-se sempre longe de mim, mas tinha-me
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abandonado a mão, que eu beijava respeitosamente.
 
De repente veio-me uma idéia. Se fosse feia! se fosse velha! se fosse uma e outra coisa!
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Nesta marcha, o meu espírito em alguns instantes tinha chegado a uma convicção inabalável sobre a fealdade de minha vizinha.
 
Para adquirir a certeza renovei o
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exame que tentara a princípio: porém, ainda desta vez, foi baldado; estava tão bem envolvida no seu mantelete e no seu véu, que nem um traço do rosto traía o seu incógnito.
 
Mais uma prova! Uma mulher bonita deixa-se admirar, e não se esconde como uma pérola dentro da sua ostra.
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A mulher é uma flor que se estuda, como a flor do campo, pelas suas cores, pelas suas folhas e sobretudo pelo seu perfume.
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Dada a cor predileta de uma mulher desconhecida, o seu modo de trajar e o seu perfume favorito, vou descobrir com a mesma exatidão de um problema algébrico se ela é bonita ou feia.
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Já vê, minha prima, porque esse odor de sândalo foi para mim como uma revelação.
 
Só uma mulher distinta, uma
Só uma mulher distinta, uma mulher de sentimento, sabe compreender toda a poesia desse perfume oriental, desse hatchiss do olfato, que nos embala nos sonhos brilhantes das Mil e uma Noites, que nos fala da Índia, da China, da Pérsia, dos esplendores da Ásia e dos mistérios do berço do sol.
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Só uma mulher distinta, uma mulher de sentimento, sabe compreender toda a poesia desse perfume oriental, desse hatchiss do olfato, que nos embala nos sonhos brilhantes das Mil e uma Noites, que nos fala da Índia, da China, da Pérsia, dos esplendores da Ásia e dos mistérios do berço do sol.
 
O sândalo é o perfume das odaliscas de Stambul e das huris do profeta; como as borboletas que se alimentam de mel, a mulher do Oriente vive com as gotas dessa essência divina.
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Tudo isto passou-me pelo pensamento como um sonho, enquanto eu aspirava ardentemente essa exalação fascinadora, que foi a pouco e pouco se desvanecendo.
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Era bela!
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Senti a sua mão apertar a minha mais estreitamente; vi uma sombra passar diante de meus olhos no meio do ruge-ruge de um vestido, e quando dei acordo de mim, o carro rodava e eu tinha perdido a minha visão.
 
Ressoava-me ainda ao ouvido uma
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palavra murmurada, ou antes suspirada quase imperceptivelmente:
 
— Non ti scordar di me!...