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Não usára comnosco tal crueza,Que nem nos montes fera,Nem pastor ha no campo sem tristeza.&nbsp;&nbsp;Os Faunos, certa guarda dos pastores,Ja não seguem as Nymphas na espessura,Nem as Nymphas aos cervos dão trabalho.Tudo, qual vês, he cheio de tristura:Ás abelhas o campo nega as flores,Como ás flores a aurora nega o orvalho.Eu que cantando espalhoTristezas todo o dia,A frauta que soiaMover as altas árvores tangendo,Se me vai de tristeza enrouquecendo;Que tudo vejo triste neste monte:E tu tambem correndoManas envolta e triste, ó clara fonte.&nbsp;&nbsp;As Tagides no rio, e na asperezaDo monte as Oreádas, conhecendoQuem te obrigou ao duro e fero Marte;Como em geral sentença vão dizendo,Que não póde no mundo haver tristezaEm cuja causa amor não tenha parte.Porqu'elle, enfim, dest'arteNos olhos saudosos,Nos passos vagarosos,E no rosto, que Amor com phantasiaDa pallida viola lhe tingia,A todos de si dava sinal certoDo fogo que trazia;Que nunca soube amor ser encoberto.{152}&nbsp;&nbsp;

Não usára comnosco tal crueza,
Que nem nos montes fera,
Nem pastor ha no campo sem tristeza.
  Os Faunos, certa guarda dos pastores,
Ja não seguem as Nymphas na espessura,
Nem as Nymphas aos cervos dão trabalho.
Tudo, qual vês, he cheio de tristura:
Ás abelhas o campo nega as flores,
Como ás flores a aurora nega o orvalho.
Eu que cantando espalho
Tristezas todo o dia,
A frauta que soia
Mover as altas árvores tangendo,
Se me vai de tristeza enrouquecendo;
Que tudo vejo triste neste monte:
E tu tambem correndo
Manas envolta e triste, ó clara fonte.
  As Tagides no rio, e na aspereza
Do monte as Oreádas, conhecendo
Quem te obrigou ao duro e fero Marte;
Como em geral sentença vão dizendo,
Que não póde no mundo haver tristeza
Em cuja causa amor não tenha parte.
Porqu'elle, enfim, dest'arte
Nos olhos saudosos,
Nos passos vagarosos,
E no rosto, que Amor com phantasia
Da pallida viola lhe tingia,
A todos de si dava sinal certo
Do fogo que trazia;
Que nunca soube amor ser encoberto.{152}
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