1Esperando uma bonança,
cansado já de esperar
um pescador, que no mar
tinha toda a confiança:
receoso da tardança
de um dia, e mais outro dia
pela praia discorria,
quando aos olhos de repente
uma onda lhe pôs patente,
quanto uma ausência encobria.

2Entre as ondas flutuando
um vulto se divisava,
sendo, que mais flutuava,
quem por ela está aguardando:
e como maior julgando
o tormento da demora
como se Leandro fora,
lançar-se ao mar pertendia,
quando entre seus olhos via
quem dentro em seu peito mora.

3Mora em seu peito uma ingrata
tão bela ingrata, que adrede
pescando as demais com rede,
ela só com a vista mata:
as redes, de que não trata
vinha agora recolhendo;
porque como estava vendo
todo o mar feito uma serra,
vem pescar almas à terra,
de amor pescadora sendo.

4Logo que à praia chegou,
tratou de desembarcar,
mas sair o sol do mar
só esta vez se admirou:
tão galharda enfim saltou,
que quem tão galharda a via,
justamente presumia,
para mais abono seu,
que era Vênus, que nasceu
do mar, pois do mar saía.

5Pôs os pés na branca areia,
que comparada cos pés
ficou pez, em que lhe pes,
porque em vê-la a areia areia:
pisando a margem, que alheia
de um arroio os dois extremos,
todos julgamos, e cremos
Galatéia a Ninfa bela,
pois bem que vimos a Estrela,
fomos cegos Polifemos.

6Toda a concha, e toda a ostrinha,
que na praia achou, a brio,
mas nenhum aljôfar viu,
que todos na boca tinha:
porém se em qualquer conchinha
pérolas o sol produz,
daqui certo se deduz,
que onde quer, que punha os olhos,
produz pérolas a molhos
pois de dois sóis logra a luz.

7Em uma portátil silha
ocaso a seu sol entrou,
e pois tal peso levou,
não sentiu peso a quadrilha:
vendo tanta maravilha
tanta luz de monte a monte,
abrasar-se o Horizonte,
temi com tanto arrebol,
pois sobre as Pias do sol
ia o carro de Faetonte.