Teus olhos são negros, negros,
Como as noites sem luar...
São ardentes, são profundos,
Como o negrume do mar;
Sobre o barco dos amores,
Da vida boiando á flor,
Douram teus olhos a fronte
Do Gondoleiro do amor.
Tua voz é a cavatina
Dos palacios de Sorrento,
Quando a praia beija a vaga,
Quando a vaga beija o vento;
E como em noites de Italia,
Ama um canto o pescador,
Bebe a harmonia em teus cantos
O Gondoleiro do amor.
Teu sorriso é uma aurora,
Que o horizonte enrubesceu.
— Rosa aberta com o biquinho
Das aves rubras do céo;
Nas tempestades da vida,
Das rajadas no furor,
Foi-se a noite, tem auroras
O Gondoleiro do amor.
Teu seio é vaga dourada
Ao tibio clarão da lua.
Que ao murmurio das volupias
Arqueja, palpita núa:
Como é doce, em pensamento,
Do teu collo no langor.
Vogar, naufragar, perder-se
O Gondoleiro do amor?!
Teu amor na tréva é um astro.
No silencio uma canção,
É briza — nas calmarias,
É abrigo — no tufão;
Por isso eu te amo, querida,
Quer no prazer, quer na dor...
Rosa! Canto! Sombra! Estrella!
Do Gondoleiro do amor.
Recife, Janeiro de 1867.