Hum Homem que caçava Rato, prendeo na armadilha huma Doninha. Ella vendo-se era seu poder, lhe disse que a soltasse, e allegou razões, dizendo que ella nenhum mal lhe fazia, antes lhe alimpava a casa de ratos e bichos, e sempre por lhe fazer bem os andava matando. Respondeo o homem: Se tu por fazer bem o fizeras, devia-te eu agradecimento; mas como o fazes pelo comer, não te devo nada, antes te quero matar, que se elles te faltarem, comer-me-has o meu, peior do que o fazem os mesmos ratos.
Do que os homens fazem por seu respeito nenhum agradecimento se lhes deve; que a boa obra ha de ser voluntaria e não acaso, para que obrigue a quem a recebe. Esta Doninha he como muitos homens que até as más obras que fazem, querem vender com boas palavras e que se lhes fiquem devendo. Porém a intenção dá á obra os quilates; quem me deo huma lançada por me matar, e me abrio o apostema, que me matava, não foi amigo, posto que me causou saude. Porém devo-a só a Deos, que por mão do inimigo ma quiz dar.